11 de nov. de 2016

Os Estados Unidos de Donald Trump, um país latino-americano Danilo Sartorello Spinola Editor O Império ruiu com a decisão da votação do povo estadunidense. Ruiu porque os 1%, passados 40 anos de pilhagem, deixaram nús os outros 99%...

Os Estados Unidos de Donald Trump, um país latino-americano

A sociedade norte-americana está se assemelhando dia após dia aos países latino-americanos. O principal ponto de similaridade é a desigualdade crescente. O ressurgimento do rentismo e o papel do lobby se reforçam como forma de captura das instituições representativas democráticas
Donald Trump venceu as eleições americanas. Contra todos os prognósticos de pesquisa prévia e para desespero de todos que acreditam no conceito civilizatório trazido pela democracia.
Para a América Latina, os prognósticos infelizmente estão longe de ser positivos com tal resultado. Tais eleições são motivo real de espanto e profunda lamentação. A lógica do muro venceu toda a ideia de coletividade, civilidade. Não que a candidatura democrata representasse a vitória da unidade americana, mas o desafio se radicalizou.
Ao invés da merecida depressão com o processo, no entanto, vale centrar-se em um conjunto de fatos cada vez mais claros. A sociedade norte-americana está se assemelhando dia após dia em sua estrutura, política, economia e toda sociedade à observada nos países latino-americanos.
E isso longe e ser fruto do fluxo de imigração do sul para o norte.
Tratar da latinização americana é destacar que problemas estruturais e de formação econômica e social de nosso continente estão surgindo e se condensando com força no norte. É destacar que uma eleição de tão baixo nível de discussão escancara processos que impressionam pela similaridade (e inclusive superação) com sufrágios realizados na parte de baixo do trópico de câncer.
O principal ponto de similaridade é a desigualdade crescente. É a contraposição dos movimentos de “99% x 1%” que emergiram após a crise de 2008 para denunciar o abismo social que está em construção. É, coincidentemente, similar à forma de medida que usamos para destacar nossa região latina com os mais altos índices de gini (medida de desigualdade) do planeta. O movimento “Occupy Wall Street” demonstra a insatisfação com esse processo de segregação social por renda e riqueza, de certo ineditismo no norte. Vê-se claramente a formação progressiva de uma elite oligárquica advinda do mercado financeiro com interesses pouco “capitalistas” em seu sentido clássico. O ressurgimento do rentismo e o papel do lobby se reforçam como forma de captura das instituições representativas democráticas. A democracia, assim como no sul, tornou-se a plutocracia dos endinheirados.
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Em um segundo ponto, vê-se a desindustrialização marcante na sociedade americana. A migração de atividades a regiões do globo cujas vantagens de custo são usufruídas pelas empresas transnacionais resultou em forte processo de redução do peso do setor industrial na produção americana. Por um lado defende-se ser essa uma mudança estrutural a setores de serviços. Por outro, é a perda considerável de trabalho e renda em território nacional, desestruturando cadeias de produção e criando enclaves produtivos. Estrutura parecida à observada nos países o sul.
Terceiro, deve-se destacar que, assim como na América Latina, as igrejas e o papel religioso como formação política conservadora é relevante. A separação entre igreja e estado se está reduzindo e essa mescla cria riscos à manutenção do estado laico. É o criacionismo defendido como forma de explicação da formação do mundo nas escolas públicas. Isso sem falar na regressão do discurso em temas sensíveis às minorias.
Por fim, a política. A emergência de um aventureiro magnata da mídia com um discurso racista, protecionista, elitista, com desprezo aos direitos humanos, é novo no norte. E sem precedentes uma figura assim ascender ao posto político mais alto por voto popular. De uma perspectiva da sua representação, Trump condensa o mais assustador. Por um lado tem um discurso conservador, de elite e tecnocrata observado em políticos “que não se dizem políticos” com o pior do desrespeito falastrão, autoritário, de uma figura como Bolsonaro. É o fortalecimento de uma direita autoritária que se põe progressivamente recrudescida, usando como bode expiatório temas sensíveis como imigração.
O tipo de Trump seria infelizmente uma forma de presidente comum já observado em qualquer de nossas repúblicas latino-americanas. Principalmente durante períodos de exceção.
Agora, do ponto de vista da América Latina e do Brasil, cabe respirar e recuperar-se do baque. O futuro traz um prognóstico tenebroso. Temos o desafortunado mau hábito de copiar o pior do que há na sociedade americana. E agora nos estão imitando de volta nesse ciclo cumulativo desastroso. É a hora de re-aglutinar forças, de pensar na esquerda em conjunto. É a hora do campo progressista se unificar, e agora com mais urgência do que nunca. O avanço desse tipo de política e padrão de sociedade vindo dos resultados das eleições americanas é um ataque feroz ao projeto civilizatório. Ter mais uma sociedade oligárquica nesse grupo não facilitará o trabalho.
E aos americanos só lhes digo: ¡Bienvenidos a Latinoamérica!
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