16 de mar. de 2017

Fundação Renato Azeredo: um pequeno episódio de R$ 212 milhões da saga tucana

Fundação Renato Azeredo: um pequeno episódio de R$ 212 milhões da saga tucana

O processo do mensalão Tucano (do PSDB), que o Ministério Público Federal considera “o embrião” do esquema de corrupção petista, avança devagar, longe das câmeras e sem status de espetáculo. Um episódio envolve o próprio Azeredo e que passa longe da mídia: investigações estão em andamento sobre a Fundação Renato Azeredo, outra entidade vinculada ao ex-governador.
Recentemente a mídia burguesa no Brasil deu muito destaque ao chamado escândalo do mensalão do PT, principalmente durante as campanhas de reeleição de Lula e das eleições municipais de 2012. Já o processo do mensalão Tucano (do PSDB), que o Ministério Público Federal considera “o embrião” do esquema de corrupção petista, avança devagar, longe das câmeras e sem status de espetáculo. No dia 27/03, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o julgamento do  ex-governador de Minas Gerais Eduardo Azeredo, réu do mensalão tucano, deveria ser realizado pela primeira instância de Justiça de Minas Gerais e não pelo STF. Azeredo renunciou em fevereiro de 2014 a seu cargo de deputado estadual, fato que os juízes do Supremo não consideram como uma manobra, ainda que tenham considerado uma manobra de José Genuíno e outros petistas durante o outro mensalão, aquele que foi intensamente televisionado. O fato do mensalão tucano ter sido desmembrado e, especificamente, de Azeredo ser julgado em Minas só pode ser interpretado como uma manobra jurídica e sobretudo política. A conduta do STF e da mídia burguesa não pode ser interpretada ingenuamente principalmente em ano de eleição, já que o PSDB lança como candidato Aécio Neves, filho de uma tradicional família mineira, já envolvido em outra investigação de desvio de verbas públicas.

O mensalão tucano apareceu nos principais meios de comunicação em 2007 como “mensalão mineiro”, como se fosse um probleminha regional, e envolvia originalmente 15 suspeitos a serem julgados separadamente, entre eles Marcos Valério. Dos réus, apenas dois sentariam perante o STF: Azeredo e Clésio Andrade, ex-vice-governador de Aécio e PMDBista de peso no estado, que pretende lançar sua própria candidatura a governador este ano, bem longe da aliança com o PT. O esquema de corrupção veio à luz como denúncia de caixa 2 na reeleição de Azeredo em 1998. Segundo o procurador-geral da República, o então governador autorizou que as empresas estatais Copasa (saneamento), Comig (mineração) e Bemge (Banco do Estado de Minas Gerais) pagassem R$3,5milhões (R$9milhões em valores atuais) por eventos. Esse dinheiro chegava através de empréstimos fraudulentos no Banco Rural à empresa de Marcos Valério (da qual Andrade era vice-presidente) e eram repassados à campanha de Azeredo, mecanismo que ficou conhecido como “valerioduto”.

A orgia do PSDB com os cofres públicos não para por aí. Fora todas as denúncias feitas no livro “Privataria Tucana” durante o governo de FHC, existe um episódio menor que envolve o próprio Azeredo e que passa longe dos holofotes midiáticos. Investigações estão em andamento sobre outra entidade vinculada ao ex-governador, que estaria rendendo frutos até hoje: a Fundação Renato Azeredo, criada durante seu governo em homenagem a seu pai, famoso político mineiro do PSD.

Segundo sua página oficial, a Fundação de Apoio e Desenvolvimento da Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais - Renato Azeredo (FRAMINAS) foi criada em 1996 pelo então governador Azeredo para “apoiar as ações da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG)”. Em seus 18 anos de serviço, a FRAMINAS acumulou uma lista com mais de 1.500 clientes, entre eles: grandes transnacionais como a Anglogold Ashanti (privada) e a Petrobras (mista); instituições como a FECOMERCIO, o SENAC e o SEBRAE; mais de 39 prefeituras mineiras; 21 secretarias e subsecretarias estaduais e municipais; 29 fundações sem fins lucrativos; e os mais diversos órgãos públicos do estado - desde empresas como a Copasa e BHTrans (Transportes de Belo Horizonte), ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA-MG), até a Polícia Civil, o Superior Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais e a Câmara dos Deputados. Seus vínculos extrapolam o estado ao prestar serviços ao Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES), os Tribunais Superiores de Trabalho (TST) e Eleitoral (TSE), o Superior Tribunal de Justiça (STJ), o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o próprio STF. Em seu Relatório de Gestão de 2007/2010, a fundação alega ter gerenciado R$109 milhões em 89 projetos junto a órgãos públicos.

Presidida por Aluisio Pimenta, seu também idealizador, assessor do ex-governador Aécio Neves e companheiro político de seu avô Tancredo, a Renato Azeredo já foi alvo de notícias isoladas algumas vezes antes. Segundo matéria no jornal O Globo, entre 2002-2006 a FRAMINAS recebia R$20milhões anuais de secretarias mineiras, valor reduzido a R$8milhões em 2007, quando a Justiça obrigou a quebra dos contratos devido a irregularidades. Só a Rede Minas (TV estatal), durante esse período, repassou R$17,6 milhões à FRAMINAS por diversos serviços prestados, inclusive de marketing. A FRAMINAS subcontratava uma cooperativa para prestar serviços de marketing ao canal, tendo que responder processo também por violação de direitos trabalhistas. Acusações de irregularidade perseguiram a Renato Azeredo também nos seus contratos com o Departamento de Obras Públicas do Estado de Minas Gerais (DEOP). O DEOP transferiu, sem licitação, R$27,4milhões para “consultoria de obras e serviços” sendo que essa não é a especialidade nem a Missão da fundação – o que justificaria a ausência de licitação – e a UEMG nem tinha curso de engenharia civil na época. O portal JusBrasil explica que em 2009 o Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais (IPSEMG) celebrou contrato através da FRAMINAS, sem licitação alguma, com a empresa Aceito Cartões para oferecer aos funcionários públicos um cartão especial para compra de remédios. O Banco de Minas Gerais S.A. (BMG), membro do conselho curador da FRAMINAS e também envolvido em ambos Mensalões, aparece como participante nesse processo, assim como a ABC Farma, que reúne todas as principais farmácias do país. O Portal estima em R$1.200.000,00 a receita mensal da FRA proveniente apenas do Cartão Medicamento. O jornal Folha de São Paulo e outros meios de comunicação divulgaram que, entre 2002 e 2011, a FRAMINAS teria recebido dos cofres públicos mineiros um total estimado em R$212,1 milhões.

Em 28/02, foi a Secretaria de Educação que decidiu romper unilateralmente e antecipadamente o contrato com a FRAMINAS, por coincidência, um dia depois de Azeredo apresentar sua defesa perante o STF. Foi com muita surpresa que os 624 analistas pedagógicos subcontratados pela Renato Azeredo para o Programa de Intervenção Pedagógica (PIP) e o programa Reinventando o Ensino Médio ficaram sabendo que dentro de pouco estariam no olho da rua. A demissão sumária ocorreu sem nenhum pronunciamento oficial por parte do governo, demonstrando que chamar o PIP de “menina dos olhos” não passou de retórica política da secretária de educação Ana Lúcia Gazolla. Os analistas terceirizados prestavam serviço para a Secretaria de Educação há pelo menos três anos, através de revezamento entre contratos com a FRAMINAS e designação na própria Secretaria, com relações de trabalho precárias e nenhuma garantia de estabilidade – mais de uma vez foram despedidos por uma entidade e logo recontratados pela outra.

Como denunciado pelo Jornal INVERTA em 2009 (ed.411), “Com o fim das estatais, passou-se a terceirizar tudo o que é obra ou serviço público, criando uma nova frente de oportunidades para saquear a máquina pública”. Ainda que só apareçam na grande mídia de vez em quando, esses episódios são parte de uma saga de muitos anos que envolve privatização, fraude e enriquecimento. O resultado nunca deixa de incluir desvio de verbas públicas de um lado, precarização do trabalho do outro. A saga tucana demonstra que, assim como todo capitalista no mundo, a burguesia brasileira precisa necessariamente explorar o trabalhador para chegar a sua verdadeira atividade-fim: gerar lucro. A atual situação dos 98 mil profissionais afetados pela Lei Complementar 100/2007 ilustra bem o descaso do presidenciável Aécio Neves com a educação. A lei decretada por ele em 2007 foi declarada inconstitucional em 2014 pelo STF, deixando os trabalhadores com uma mão adiante outra atrás. Como todo episódio da saga, é um emaranhado de manobras e irregularidades, mas os motivos e interesses por trás dessa decisão já são outro episódio da saga tucana em Minas Gerais.


Sucursal MG  http://inverta.org/jornal/edicao-impressa/472/politica/fundacao-renato-azeredo-um-pequeno-episodio-de-r-212-milhoes-da-saga-tucana
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