21 de jun. de 2017

A educação no Brasil do golpe. - Editor - Em qualquer tipo de GOLPE, onde a DEMOCRACIA É EXTIRPADA, A EDUCAÇÃO, CULTURA, CIENCIAS, PESQUISAS, SÃO INVARIAVELMENTE BLOQUEADAS, AMORDAÇADAS, DESESTIMULADAS E CALADAS. A ESCOLA SEM PARTIDO, É A MOSTRA DA CARA DO GOLPE, QUE VEEM NESSAS ÁREAS UM PERIGO EMINENTE, POIS PENSAM, REFLETEM, ANALISAM, PESQUISAM, PROPAGAM, ENFRENTAM E ISSO, QUALQUER TIPO DE GOLPISTA, SEJA MEDIÁTICO, DE PARTE DO JUDICIÁRIO,, DE ÁREAS REACIONÁRIAS,, RURALISTAS, RENTISTAS, POLITICAS, ESMAGAM. MAS A RESISTENCIA ESTÁ AI E SAIRÁ VENCEDORA.

A educação no Brasil do golpe

O Beltrano conversou com Fernando Haddad, Macaé Evaristo, Luciana Santos, Sâmia Bomfim e outros atores que lutam contra os retrocessos do governo Temer


Por Camila Bahia Braga e Lucas Simões
http://www.obeltrano.com.br/portfolio/a-educacao-no-brasil-do-golpe/

Cena de ‘Acabou a paz, isto aqui vai virar o Chile – Escolas ocupadas em São Paulo’


Não é de se espantar que Michel Temer, em seus primeiros movimentos como presidente da República, tenha escolhido a educação como alvo prioritário de sua ação de desmanche das políticas sociais públicas, implementando a reforma do ensino médio, abrindo espaço para o controverso projeto Escola Sem Partido e congelando os gastos na área por duas décadas. Mesmo afundado em denúncias de corrupção, tenta tocar reformas não debatidas com a sociedade. E na sua mira estão os estudantes, que estiveram à frente de todas as principais manifestações populares dos últimos anos, desde as jornadas de junho de 2013, o maior levante de protestos de rua da história recente do país, passando pelas ocupações das escolas em 2015 e 2016, que exigia uma educação libertadora e de qualidade, até o atual movimento Fora Temer.
Diante do caldeirão de retrocessos, o Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), que levou cerca de 10 mil pessoas à UFMG, em quatro dias de um grande encontro encerrado neste domingo (18), acendeu novamente a chama de uma juventude protagonista na ação e na resistência por direitos. Foram centenas de debates acalorados no campus da Pampulha, entre alunos, pesquisadores, políticos e medalhões vindos do país inteiro. Curiosamente, o quadro de fragilidade da educação diante da ameaça conservadora, acabou por gerar um consenso unificador entre camisetas de movimentos políticos distintos, para além das divergências teórico-ideológicas comuns a uma esquerda jovem, enérgica e diversa.
“Nós ocupamos mais de mil escolas e, se precisar, ocuparemos tudo de novo. Escola com censura, com mordaça, não”, avisa Camila Lanes, presidenta da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES). “Você acha mera coincidência o governo federal querer excluir sociologia, arte e história imediatamente das grades curriculares básicas, sem debater com a sociedade?”, questiona a deputada federal Luciana Santos (PCdoB/PE), ex-presidente da UNE nos anos 1980.
Para a deputada, a educação passa por um momento de “urgência crônica na UTI”. A desestruturação de um trabalho de longo prazo como é o Plano Nacional de Educação (PNE), diz, tem por trás interesses econômicos profundos. Aprovado pela então presidenta Dilma Rousseff em 2014, o plano incluía a destinação de 75% dos royalties do pré-sal para a educação, e outros 25% para a saúde, em medida inédita no país. Porém, com a aprovação da PEC 55, convertida na Emenda Constitucional (EC) 95, conhecida como ‘Teto de Gastos’, a previsão de investimento foi descartada.
“Na prática, eles inviabilizaram o PNE em menos de um ano. O Plano é uma conquista histórica do movimento estudantil, traçado e conversado há anos. Nós iríamos garantir que, até 2024, 10% do PIB fosse investido na educação. Isso significaria colocar o Brasil entre os quatro países do mundo que chegaram nesse patamar. É revolucionário, mas, com as mudanças do Temer, isso vai pelo ralo”, argumenta a deputada. “O que a gente tem visto, recentemente, é o contrário do que havia sido proposto. A UERJ está agonizando pela falta de repasses federais e pela má administração estadual. As universidades públicas federais e estaduais estão em regime de contenção de despesas. Há um trabalho muito forte do governo para destruir o que está sendo construído há décadas”, reforça Luciana Santos.
Haddad
O ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT/SP), bastante assediado no campo político, tentou ao máximo manter as conversas focadas na educação. Em entrevista a O Beltrano, o hoje professor licenciado da USP e docente da faculdade privada Insper, situada na zona sul paulista, destacou a “necessidade absoluta de expressão livre” que os estudantes começaram a manifestar devido às políticas inclusivas dos últimos anos doze anos. “Principalmente aquelas pessoas que a casa grande sempre quis manter na senzala”, como ele enfatiza.
O salto de mais de 5 milhões de alunos no ensino superior entre 2003 e 2014, segundo dados do Ministério da Educação (MEC), e entre eles minorias historicamente excluídas do ensino no país, através das cotas para negros e indígenas e de programas como ProUni e Reuni, é apontado pelo petista como prova do protagonismo recente da educação.
“Esses 5 milhões a mais no ensino superior não são iguais aos 3 milhões que estavam matriculados anteriormente. Sãos os pretos, pobres, filhos do trabalhador comum, que chegaram à porta da universidade não para fazer a faxina, e sim para estudar. Isso a gente precisa valorizar”, disse. “E aí você tem um cenário curioso. Para mim, a expansão da educação no Brasil e a qualificação do sistema é fundamental para se falar do que estamos mais carentes hoje. Estou falando de um ambiente em que as pessoas que estão se formando possam opinar sobre os destinos do país com o conhecimento que estão produzindo e adquirindo na universidade. Será mesmo que o cidadão do século 21 (esse com acesso inédito a uma universidade) vai aceitar o Brasil do século 19? Ou será que estamos num movimento novo, de insurgência contra esse estado, e de não aceitação da camisa de força que estão tentando impor ao país?”, provoca Haddad.
Escola Sem Partido
No cerne do debate educacional, o projeto Escola sem Partido está na vanguarda dos ataques à educação brasileira. O Escola sem Partido foi criado em 2004 pelo advogado Miguel Nagib, procurador do Estado de São Paulo em Brasília desde 1985, e ganhou atenção nacional quando começou a ser debatido nas instâncias legislativas federal, estaduais e municipais. Com roupagem para combater um suposto “ensino ideológico”, a proposta levou o vereador Fernando Holiday (DEM/SP) a ir pessoalmente coagir professores em uma escola da capital paulista, contrariando suas próprias atribuições como parlamentar.
Para Sâmia Bomfim, vereadora pelo PSOL em São Paulo, o aparecimento do tema entre os legisladores surgiu como uma reação à força demonstrada por estudantes e educadores durante as ocupações de 2016, quando mais de mil escolas foram tomadas por semanas a fio contra a PEC 241, hoje EC 95, que congelou os gastos do Estado em educação e saúde pelos próximos 20 anos. “É uma tentativa de barrar esse potencial explosivo, um medo que eles têm de as novas gerações saberem seu papel na sociedade, questionarem e saírem das escolas dispostos a mudar mesmo, o mundo, a política”, analisa Sâmia.
A Secretária de Educação de Minas Gerais, Macaé Evaristo, avalia que o Escola Sem Partido é um braço mais amplo de um projeto político e econômico para o Brasil. “É um movimento que se expressa como Escola sem Partido, mas que na minha visão tem um partido muito bem definido e posições muito claras para um combate a todo o ideário que construímos de uma educação pública, laica, democrática”, afirma Macaé.
Além disso, o movimento encontra consonância no discurso da crise, que precariza as condições de trabalho enquanto diminui o potencial de cada cidadão: “O objetivo é fazer uma produção em série, formar um exército de trabalhadores da forma menos reflexiva e mais rudimentar possível”, complementa a vereadora Sâmia Bomfim.
O enredo para o corpo que vem ganhando a ideia do Escola Sem Partido vem desde 2003, quando foi aprovada a lei 10.639, que inseria história e cultura dos africanos e afro-brasileiros nos currículos escolares dos ensinos fundamental e médio. Posteriormente, a história e cultura dos povos indígenas também foi incluída. Ambas as medidas foram comemoradas pelos movimentos negros e indigenistas. Mas, à medida que religiões pentecostais ascenderam com mais força no Brasil, cresceu também a intolerância religiosa, especialmente contra credos e costumes de raiz africana.
Nesse clima, em 2014, a bancada cristã conseguiu barrar a inclusão da “superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da igualdade racial, regional, de gênero e de orientação sexual” do Plano Nacional da Educação – ao que o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) classificou como “kit gay”.
“Eu tive que ouvir de um padre se eu achava certo, como professora, ensinar as crianças a fazer sexo, ou a fazer sexo com pessoas da própria família. O debate foi travado em cima de muita ignorância”, conta Amanda Gurgel, ex-vereadora e professora da rede pública de Natal (RN). “Por trás dessa discussão há forças religiosas que buscam romper com a laicidade do Estado, privatizar os conteúdos das escolas públicas para os seus interesses e crenças”, completa a Secretária de Educação Macaé Evaristo.
Ela ainda analisa que outro ponto obscuro do projeto é a desvalorização da educação pública, favorecendo a discussão em torno das privatizações. “É a ideia de que tudo que é público é ruim e tudo que é privado é bom, para destruir a escola pública e fazer com que os recursos sejam drenados para empresas privadas e para o mercado, e não mais para as instituições públicas”.
Ainda assim, a secretária de educação tem apostado no avanço de outras frentes para combater as medidas retrógradas na educação brasileira. “Nós fizemos uma alteração recente em Minas Gerais, permitindo que os alunos escolham o nome social adotado na escola, o que é uma tendência no Brasil. No caso de Minas, nós temos uma pesquisa que aponta que travestis e transsexuais são o público com menor escolarização do estado. Temos um número alto de analfabetismo entre esses adultos. É importante que a escola esteja organizada para receber esses estudantes. E a garantia do nome social é uma das ferramentas para isso, inclusive combatendo o Escola Sem Partido”, ressalta Macaé.
Iniciativas
Na contramão do projeto Escola Sem Partido, o pedagogo Josemar Carvalho integra a Rede Emancipa, um projeto com dez anos de atividades e com cerca de 55 cursinhos pré-vestibulares gratuitos espalhados por estados como Rio e Janeiro, Rio Grande do Norte, Pará, São Paulo e Rio Grande do Sul, e que neste ano terá a primeira unidade na capital mineira. A premissa do cursinho, além de uma educação dialógica, ou seja, fundamentada na troca de saberes entre estudante e professor, e não apenas na mediação do conhecimento pelo professor, é que as aulas ofereçam perspectiva crítica e reflexiva.
“A gente trabalha não somente com a aprovação no vestibular, mas também com a formação do ser humano. Nos dispomos a ser um movimento social que trabalha pela educação. É uma rede que visa a educação crítica, que permita ao aluno pensar por si mesmo com uma pluralidade de instrumentos. Então, o Emancipa tem nota, faz atividade de rua, questiona, e faz círculos de debates sociais. Entramos agora na campanha pela liberdade de Rafael Braga (único preso nas Jornadas de Junho de 2013, condenado há 11 anos e três meses de prisão por portar uma garrafa de pinho sol na mochila)”, diz Josemar.
“Estamos começando um trabalho em BH com a nadadora Joana Maranhão, num projeto chamado Emancipa Esportes, que vai levar também atividades esportivas aos estudantes. Na cidade onde atuo, São Gonçalo, região metropolitana do Rio de Janeiro, vamos começar um trabalho com presidiários. Então, as possibilidades sociais são inúmeras”, completa Josemar.
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