9 de ago. de 2017

A elite empresarial venezuelana que defende o neoliberalismo, mas não vive sem o Estado. - Editor - LÁ OU AQUI, É TUDO FARINHA DO MESMO SACO. CABE AO POVO, SEPARAR O JOIO DO TRIGO, TIRANDO ESSA ELITE DO PODER. DIRETAS NELES JÁ.


A elite empresarial venezuelana que defende o neoliberalismo, mas não vive sem o Estado.

Escrito por , Postado em Tulio Ribeiro

(Imagem Randon Photos:Guilhermo Cisneros,Roberto Marinho e Gustavo Cisneros)
“Os povos são vulneráveis as ações de quem, em busca de interesses particulares, intervém de maneira arteira sobre os mercados”. Assim, a economista venezuelana Pasqualina Curcio Curcio[1] define, como é frágil a posição da população diante de um mercado oligopolizado de empresários que escolheram a importação e distribuição, relegando a atividade produtiva. A razão é a máxima de que especular representa uma margem maior que desenvolver uma manufatura.
A prática dos grandes grupos empresariais da Venezuela está ligada a forma que cresceram e de como lotearam os setores da economia do país. Entrementes, a teorização que deveria se reportar aos conceitos dos empresários seria o neoliberalismo. Neste sentido, pode-se visitar os estudos do Nobel de 1974, Friedrich August von Hayek, pai desta escola austríaca, que balizou o ideário de competição defendido pelos empresários, e que foram alicerce das políticas de Margareth Thatcher na Inglaterra e Ronald Reagan nos anos noventa. Hayek possuía como premissa que “o indivíduo possui vontades e interesses próprios, insensível as classes ou cadeias socioculturais que pertencesse, segundo ele, uma aspiração¨ própria e pronta¨. Desta forma, esta liberdade deveria ser a garantia do seu crescimento e, logo, um valor supremo. Portanto, seria o livre mercado detentor de um paradigma universal refutando qualquer intervenção estatal neste ambiente de “eficiência e o livre-arbítrio”. É desta forma idealizada por Hayek que deveria pautar as práticas dos conglomerados privados venezuelanos. Todavia, percorrendo o processo histórico, é concluso a percepção que os grandes grupos se afastaram desta conduta natural em proveito próprio.
Em sentido contrário “ao neoliberalismo teórico”, poderíamos buscar nos textos de Karl Marx o sentido pragmático do empresariado. A questão essencial está no retorno que se alcança com esta postura do setor privado e no conceito de mais-valia amplamente estudado pelo alemão.
A mais-valia não foi criada a partir da troca, mas pelo fato de que o desenvolvimento dos meios de produção em um sistema capitalista permitia aos povos do capital usufruir o valor de uso da força de trabalho do operário e, com ele, criar produtos que excediam em muito o mero valor de troca da força de trabalho, que chegava não mais do que o mínimo necessário para subsistência do trabalhador[2].

Partindo desta reflexão, podemos identificar que a concepção da mais-valia é, conceitualmente, uma garantia de ganho ao capital em relação à renda do trabalhador. Entretanto, quando acrescentamos a práxis da especulação de mercadorias feita pelos conglomerados venezuelanos, este ganho se multiplica, alcançando um patamar bem maior. Este fato ocorre por duas premissas, inseridas na realidade do mercado: a primeira se apresenta pelo caráter empresarial de distribuidores de produtos internacionais, não sofrendo o custo do estoque que uma grande indústria tem numa produção elevada; a segunda é a formatação de oligopólios de setores no poder de poucas companhias privadas. As condições ideais para a prática da especulação, e majorar lucros, estavam postas.
Do prisma da observação, quando se pretende abordar as estratégias da elite  empresarial venezuelana, deve-se focalizar três grupos familiares: os Cisneiros, os Mendozas e os Escotets. É neste campo que se demonstra uma contradição evidente, entre a defesa de uma “liberdade” econômica, mas uma atuação próxima às benesses do Estado.
Os Cisneiros são um conglomerado de patrimônio acima de 1,5 bilhão de dólares, com atuação em telecomunicação, entretenimento e varejo. O seu ativo significa que é o mais rico da Venezuela. Ainda em 1932, no governo de Juan Vicente Gomes, a família teve o primeiro contato com os negócios com o governo, ganhou um contrato de recapagem do asfalto público e, um ano depois, a concessão de transporte urbano. A máxima que norteia a Venezuela: petróleo e Estado. A política de representações de marcas estadunidenses se inicia em 1939, com a Pepsi-cola e, em 1940, com a distribuição dos carros “Studebaker”. Talvez seja o cerne da visão dos conglomerados venezuelanos, a proximidade com o governo e a defesa dos negócios atrelados a distribuir produtos dos EUA, um paradigma de difícil superação pela produção Nacional.
A luz da proximidade com o governo do partido “Accion Democratica”, recebeu a concessão de uma televisão por apenas assumir a dívida trabalhista, o canal quatro que passou a se chamar Venevisión, a partir de 1960, permitiria acrescer sua fortuna e servir a governos, sem nunca esquecer de cobrá-los. Não era apenas um tino comercial mas, principalmente, sentido político.  Em 1989, com o “Caracazo”, uma revolta popular pelas baixas condições de vida da população, sua rede de supermercado foi saqueada. Nesta época, era larga sua rede de negócios (Ford, Singer, Underwood) e diante da crise passou a remeter capital para os negócios na Espanha e, principalmente, para os Estados Unidos. A Venevisión serviu a presidentes impopulares como Carlos Andrés Peres, no início dos anos noventa e a Pedro Carmona, na elaboração do mal sucedido golpe contra Hugo Chávez em 2002. Os Cisneiros construíram um império de comunicação como a Directv e a Univision, esta última lider na produção latina para a América do Norte. Através do seu grupo  Venevisión Caracas,e  seu outro canal de televisão chamado  Caracol na Colômbia, formou a união das principais mídias sul americanas permitindo uma associação na defesa do neoliberalismo mas baseadas em concessões públicas. Ao seu lado estavam, El Mercúrio no Chile, Clarín na Argentina, Globo no Brasil. Além de representar um exemplo de contradição, formatou uma mídia ativa ao reverberar os interesses da norte na América Latina.
Dentro do cenário de guerra econômica que sofre o governo da Venezuela, os “Mendoza” é o grupo indubitavelmente que mais possui poder sobre a população, devido a sua ampla ação oligopolista em produtos de primeira necessidade. A Polar é a maior empresa privada do país, com um catálogo diverso, desde cerveja até a farinha, que é o alicerce alimentar do venezuelano.
Para melhor entendermos este contexto, devemos lançar o olhar a relação de uma ampla gama de produtos da Polar e um leque de subsídios do governo federal a alimentos básicos, via incentivo cambial. Deste modo, se o estado fornece recursos em dólar a uma taxa muito baixa, com objetivo de reduzir o custo a maioria da população, o grupo Polar atua em alcançar o máximo destes montantes subsidiados. A ideia é de transgredir este modelo, utilizando dólar mais barato para importar, mas na ponta do varejo, comercializar mercadorias fundamentado na cotação do paralelo. A título de informação, o “Dipro”(subsidiado[3]) está a dez bolívares por dólar; enquanto no mercado paralelo[4], a onze mil cento e oitenta e cinco bolívares.
É inconcebível que numa nação com a maior reserva de petróleo do planeta, farta quantidade de recursos minerais e um mercado de trinta milhões de pessoas, o maior conglomerado industrial pratique a especulação cambial em detrimento da produção. Diante de uma nação que possui o maior negócio em valor agregado que é o petróleo, o capital privado escolhe a margem gerada pelo ágio financeiro. Esta dinâmica dos “Mendoza” é possível pelo poder de monopólio que exerce em muitos setores. A falta de produtos de forma proposital facilita a majoração, principalmente em períodos eleitorais, realimentando um sistema de guerra econômica e, principalmente, política contra o governo federal. O mesmo que ela demanda o incentivo. É uma forma de tutelar o país com o desabastecimento que só incentiva o empobrecimento da população de menor renda.
Na tumultuada conjuntura do modo de operação do empresariado nacional, o maior banco privado da Venezuela, chamado de Banesco, que deveria ocupar-se na capitação de recursos e posterior financiamento a produção, bem como ao consumo, concentrou-se em se aproveitar das diversas crises financeiras do país.
A família Escotet, com operações nos Estados Unidos, República Dominicana, Porto Rico e Colômbia construíram o império conglomerado Banesco a partir de operações de negociação de títulos do estado na crise financeira do governo nos anos noventa. A atual oposição venezuelana, era governo naquele momento e tinha levado o país a insolvência do Estado, chamado de “viernes negro”. O grupo passou a operar fortemente nas oscilações dos títulos, remessa de dívidas para outros países e no fomento as privatizações. Quem devia irrigar o país com crédito, passou a lucrar enormemente com a venda de patrimônio estatal ou sua desvalorização, através de engenharias financeiras que atuaram contra a nação no mercado internacional. Na prática é,gerando a ruína do Estado no processo histórico, o Banesco acumulou grande montante de capital.
Este modo de operação evoluiu para os dias atuais, diante do bloqueio de crédito administrado por fundos internacionais. Indubitavelmente os Escotets migraram da função de banco, para a especulação do câmbio, remessas ilegais de recursos e, principalmente, comprar ativos que ele ajudou a desvalorizar.
É interessante notar que, guardadas as distinções da atividade de comunicações dos Cisneiros, do setor de bens de primeira necessidades dos Mendozas ou do financeiro dos Escotets, eles elaboraram um sofisticado modo operante. Neste paradigma, relevaram a atividade principal, assumindo como objetivo se beneficiar de incentivos ou oportunidades propiciadas pelo Estado, que seriam recursos originalmente destinados a população. Na forma do contraditório, apesar de reverberar o discurso neoliberal, é no Estado que na prática eles buscam viabilizar sua atividade. Como a historia mostra e a convicção se apresenta, os líderes do capital venezuelano demandam socializar suas perdas e individualizar seus ganhos.

FONTES
  1. Curcio, Pasqualina Curcio. La mano visible del mercado. Caracas: Editora Nosotro, 2017.
  2. Guanipa, Ronaldo Balza. Venezuela 2015, Economia, política y sociedad. Caracas: Fundación Korad Adenaver, 2015.
  3. Hayer, Friederich. O caminho da solidão. Rio de Janeiro: Editora Instituto Liberal, 2015.
  4. Maringoni, Gilberto. A revolução bolivariana. São Paulo: UNESP, 2008.
  5. Silva, Flavio T. R. A política de Estado sobre recursos do petróleo, o caso venezuelano. São Paulo: Editora Pillares, 2016.

[1] Curcio, Pasqualina. 2017. Pág 79.
[2] Trombley, Stephen. 2014. Pág 87.
[3] www.bcv.org.ve
[4] www.dolartoday.com (31/07/2017)
http://www.ocafezinho.com/2017/08/08/a-elite-empresarial-venezuelana-que-defende-o-neoliberalismomas-nao-vive-sem-o-estado/
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