10 de ago. de 2016

Para o DPF, grampo ilegal na Superintendência do PR é transgressão disciplinar. Editor O judiciario brasileiro com sua partidarismo, joga a lei para escanteio e isso provoca desvio de conduta em quem deve ter objetividade acima de tudo.

Para o DPF, grampo ilegal na Superintendência do PR é transgressão disciplinar
Na Portaria que instaurou o PAD contra a delegada Daniele as
informações são dissimuladas.
O Departamento de Polícia Federal (DPF), através da Portaria N° 6516/2016, assinada em 01/08 pelo seu diretor-geral, Leandro Daiello Coimbra, abriu o primeiro Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra membros da Força Tarefa da Lava Jato.

O PAD 09/2016 investigará oficialmente a delegada Daniele Gossenheimer Rodrigues, chefe do Núcleo de Inteligência Policial (NIP) da Superintendência Regional do DPF no Paraná (SR/DPF/PR). Em maio de 2015, ela teria ordenado ao Agente de Polícia Federal Dalmey Fernando Werlang — que responderá ao mesmo processo — a instalação de uma escuta ambiental, sem autorização judicial, no chamado fumódromo da Superintendência.

A Portaria instaurando este PAD foi publicada no seu Boletim de Serviço nº 145, de 2 de agosto passado, de forma dissimulada muitas vezes indecifrável até para o seu próprio público interno. Ela fala em “instaurar Processo Administrativo Disciplinar para apurar a responsabilidade funcional pelos fatos noticiados no expediente do Protocolo SIAPRO nº 08385.007180/2015-80″. Tal protocolo é o numero com o qual foi registrado no sistema de acompanhamento processual do DPF a Sindicância 05/2015, instaurada para apurar as responsabilidades pela instalação da escuta ilegal.

Apesar de tal fato ser considerado crime e de serem muitas as críticas aos grampos clandestinos, em especial no meio jurídico, inclusive entre os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), o DPF, trata o caso como mero desvio funcional. Não se tem notícia de qualquer inquérito policial para responsabilizar criminalmente seus autores.

À Primeira Comissão Permanente de Disciplina da Corregedoria Geral (Coger) do DPF, constituída pelos delegados Sebastião Carlos Carvalho, Euclides Rodrigues da Silva Filho e Ricardo Amaral Castro Ferreira, avaliará o comportamento da delegada e do agente com relação apenas a três transgressões disciplinares.

Pela portaria, conforme documento que o blog teve acesso com exclusividade, eles responderão ao previsto nos incisos VIII – “praticar ato que importe em escândalo ou que concorra para comprometer a função policial”; XX – “deixar de cumprir ou de fazer cumprir, na esfera de suas atribuições, as leis e os regulamentos”; e  XXIX “trabalhar mal, intencionalmente ou por negligência” do art. 43 que estipula as transgressões disciplinares na Lei 4878-65 (regime jurídico dos funcionários policiais civis da União e do Distrito Federal). Se forem considerados culpados, a punição máxima prevista, conforme o art. 47 da mesma lei, é a suspensão por no máximo 90 dias.

É verdade que a portaria fala que foi desconsiderado o art. 5º, inciso X da Constituição Federal — “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Mas isto, segundo alguns delegados, serve apenas para mostrar que houve ilegalidade no ato de colocar o grampo.

DPF José Washington Luiz Santos que, no mínimo, prevaricou, foi poupado. foto:policiapenaldealagoas.blogspot
DPF José Washington Luiz Santos que, no mínimo, prevaricou, foi poupado.
foto:policiapenaldealagoas.blogspot
Também chama a atenção que no Processo Administrativo Disciplinar não incluíram o delegado José Washington Luiz Santos, segundo homem na hierarquia da Superintendência.

Como narramos, em agosto de 2015, na reportagem Lava Jato revolve lamaçal na PF-PR, ele participou de uma conversa entre Daniele e Dalmey em que falaram sobre o grampo já instalado.

Nessa ocasião, conforme consta de uma gravação entregue ao diretor-geral do DPF, Daiello, Dalmey questionou a delegada sobre o alvará judicial autorizando a escuta ambiental. Na presença de Washington, ouviu Daniele desconversar:
“Você sabe que não é assim que funciona”.
Ainda que Washington não tenha participado da ordem para a instalação, o simples fato de saber de algo ilegal e nada fazer é crime de prevaricação.Também pode ter infligido dois incisos da Lei 4878/65 — o XX – “deixar de cumprir ou de fazer cumprir, na esfera de suas atribuições, as leis e os regulamentos”; e  o XXIX – “trabalhar mal, intencionalmente ou por negligência”. Apesar de tudo isso, ele, ao que parece, foi poupado pela Corregedoria ao não ser incluído no mesmo PAD.

É de se questionar se o delegado que ocupa cargo de chefia relevante pode ser sumariamente absolvido, enquanto o agente federal, que cumpriu ordem — ainda que manifestamente ilegal — e, depois, denunciou o esquema, tenha que responder ao PAD.

No documento do DPF que o blog obteve com exclusividade, consta o nome d os investigados no PAD e a capitulação dos ilícitos cometidos

No documento que conseguimos com exclusividade, além de constarem os nomes da delegada Daniele e do agente Dalmey, listam-se os artigos que ambos teriam violado. Nenhum deles prevê a demissão. (na reprodução, apagamos dados que poderiam identificar a fonte)
No documento que conseguimos com exclusividade, além de constarem os nomes da delegada Daniele e do agente Dalmey, listam-se os artigos que ambos teriam violado. Nenhum deles prevê a demissão.
(na reprodução, apagamos dados que poderiam identificar a fonte)
Desprezo dos procuradores — Como a capitulação dos ilícitos são apenas os três artigos citados acima, mesmo que ao longo do trabalho a Comissão descubra algo mais grave, os servidores só poderão ser penalizado pelo que foram instados a se defender. Para o caso de novas transgressões será preciso abrir um novo PAD.

Tanto a delegada Daniele como o agente Dalmey só poderão ser punidos pelos ilícitos citados na portaria que instaurou o Processo Disciplina. Nenhum deles prevê demissão. Fotos: reprodução
Tanto a delegada Daniele como o agente Dalmey
só poderão ser punidos pelos ilícitos citados na
portaria que instaurou o Processo Disciplina.
Nenhum deles prevê demissão.
Fotos: reprodução
Há. porém, mais duas questões. A escuta ambiental sem autorização judicial é considerada crime. Teoricamente, a própria Polícia Federal deveria instaurar um inquérito, mas não existe notícia a esse respeito. Pode ser que aleguem que se trata de uma escuta implantada em um prédio público, tese amplamente discutível.

Para reverter isso, seria necessário a Procuradoria da República em Curitiba tomar uma iniciativa. Até hoje, porém, tanto no caso deste grampo, que visava controlar as conversas dos servidores, como no episódio do aparelho de escuta instalado na cela do doleiro Alberto Youssef, descoberto em março de 2014, os procuradores da República, aparentemente, não tomaram nenhuma iniciativa para fazer cumprir a lei. Também cabe à Procuradoria da República no Paraná, mas desta feita na área cível, impetrar Ação de Improbidade Administrativa que pode culminar com demissões.

O grampo no fumódromo, encontrado em maio de 2015, como explicamos na matéria Lava Jato revolve lamaçal na PF-PR, foi instalado por Dalmey, um especialista em escutas. A ordem partiu da delegada Daniele, com a intenção de controlar as conversas de servidores. O alvo principal eram os chamados “dissidentes”, expressão cunhada pelos delegados da Força Tarefa para rotular policiais que questionavam a legalidade de algumas práticas usadas nas investigações da Lava Jato.

Desde julho de 2015, conforme documento encaminhado pela própria Polícia Federal à CPI da Petrobras na Câmara dos Deputados, estava confirmado que o grampo colocado no fumódromo não tinha autorização judicial. Portanto, era ilegal. Mas, 13 meses se passaram para que surgisse a primeira iniciativa visando a punção dos possíveis responsáveis. Diante desta demora, torna-se difícil prever que inquérito policial ou outra medida — como ação de improbidade administrativa — venha a ser tomada

O caso do grampo na cela — Daniele é casada com Igor Romário de Paulo, Delegado Regional de Combate ao Crime Organizado (DRCOR) e coordenador da Força Tarefa da Lava Jato. Ele também foi apontado por Dalmey como um dos delegados que o mandaram instalar uma escuta ambiental na cela do doleiro Youssef. Ao seu lado estavam o superintendente, Rosalvo Ferreira Franco, e o delegado Marcio Adriano Anselmo. Há um ano, descrevemos na reportagem citada:

Reprodução
Em agosto de 2015 o blog publicou o ofício da Corregedoria do DPF à CPI da Petrobras
na Câmara dos Deputados, confirmando a inexistência de autorização judicial para
aquele aparelho de escuta ambiental. Nenhuma medida foi tomada, nestes 13 anos,
para punir criminalmente seus responsáveis.
Foto: reprodução
As criticas à administração da superintendência, notadamente ao grupo de delegados que participa da Força Tarefa da Operação Lava Jato – além de Igor e Daniele, estão nela os delegados Érica Mialik Marena (chefe Delegacia de Repressão a Crimes Financeiros – Delefin), Eduardo Mauat da Silva (chefe da Delegacia de Repressão a Crimes Fazendários – Delefaz), Márcio Anselmo Adriano, (Delefaz) e Maurício Moscardi Grillo (chefe do Grupo de Investigações Sensíveis – GISE) – surgiram a partir da descoberta do grampo na cela de Youssef, em março de 2014,  uma vez que muitos dos policiais da SR/DPF/PR discordaram do andamento da sindicância instaurada para apurar o fato que, como se falou, concluiu que o aparelho estava na cela desde 2008, sem funcionar“.

A grande expectativa, porém, é com relação ao primeiro grampo ilegal encontrado na cela do doleiro Alberto Youssef, dentro da custódia da Superintendência do DPF no Paraná. Já se completaram 28 meses sem que a Polícia dê uma satisfação pública a respeito, Tampouco o juiz Sérgio Moro cobrou, publicamente, o resultado da nova sindicância que a Coain foi obrigada a refazer.

A primeira, presidida pelo delegado Maurício Moscardi Grillo, concluiu que o grampo achado por Youssef fora colocado na cela na época em que o traficante Fernandinho Beira-Mar ficou ali.

Mauricio Moscardi: sindicância refeita
Mauricio Moscardi: sindicância refeita
Moscardi não se preocupou em pedir perícia do aparelho. Encomendou um parecer ao próprio Dalmey que acabou fazendo um documento no qual afirma que o grampo, no estado em que se encontrava, não funcionava. Foi o suficiente para surgir a versão do grampo desativado.

A grande maioria dos policiais da superintendência sabia que não era verdade. Mas, ainda assim,  o juiz Sérgio Moro e os procuradores da República, aos quais cabe fiscalizar a polícia, acataram o resultado. Não queriam comprometer a Operação.

A reviravolta ocorreu um ano depois quando, em maio de 2015, o agente Dalmey confessou ao delegado federal Mario Henrique Fanton que ele mesmo tinha instalado os grampos.

Na CPI da Petrobras, não muito tempo depois, duas informações desmentiram a sindicância e deixaram mal quem aceitou sua conclusão: a Diretoria de Inteligência Policial em Brasília emitiu um documento mostrando que o aparelho só foi mandado à Curitiba meses depois da transferência de Beira-Mar da custódia; da perícia do DPF veio o informe de que 100 horas de áudios foram recuperados do sistema digital do NIP/PR — Surgem os áudios da cela do Youssef: são mais de 100 horas.

Na sindicância 04/2014, que a Coain foi obrigada a refazer, a última testemunha ouvida foi a ex-contadora de Youssef, Meire Bonfim da Silva Poza. Depois disso, pelo que se comenta na Polícia Federal, tanto em Brasília como em Curitiba, o delegado Alfredo Junqueira, da Coain, fez seu relatório e teria proposto a abertura de inquérito, com indiciamento de delegados e agentes.

Tudo isso, porém, está sendo guardado a sete chaves. Se tais medidas forem adotadas, significará que alguns dos principais delegados da SR/DPF/PR, que também estão na Lava Jato, serão investigados em apuração criminal.

Algo nada salutar à Superintendência que nos últimos anos ocupou as manchetes de jornais como sendo responsável pelo combate à corrupção no país. Mas, como a sindicância de menor importância — a do grampo do fumódromo — terminou apenas com um processo no qual se investigará somente possíveis transgressões disciplinares, a todos é permitido supor que a do grampo na cela continuará na gaveta.A não ser que o governo interino, que assumiu com o golpe do impeachment, queira chutar o balde e implodir a Operação Lava Jato. Não terá muito trabalho. Graças à própria Polícia Federal e à Força Tarefa da Lava Jato.

Marcelo Auler
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