30 de nov. de 2019

Greve Geral e rebelião: a nova via chilena

Greve Geral e rebelião: a nova via chilena

Mais de um mês de rebelião no Chile. Uma legítima insurreição popular, onde a ação direta, as barricadas, a Greve Geral e a luta combativa nas ruas são os principais elementos. O incansável povo chileno rejeita a tutela, a conciliação e a traição da esquerda institucional e enfrenta de forma heroica a repressão brutal do governo assassino e neoliberal de Sebastián Piñera. Centenas de pessoas cegas, um incontável número de presos políticos, estupros, torturas e dezenas de desaparecidos e mártires assassinados por carabineiros. Cortes de estradas por todo o país, barricadas e enfrentamentos heroicos, a beleza da música rebelde como elemento da memória histórica contra a ditadura, as expressões visuais da rebelião pintadas e coladas em todos os lugares, escudos, molotovs, muitos molotovs, lasers contra blindados e cachorros militantes enfrentando a polícia.
É uma situação pré-revolucionária, com um governo reacionário e pró-imperialista derrotado e acuado que aumenta a brutalidade da repressão e tem como resposta o crescimento da radicalização e da resistência do povo rebelado nas ruas. A classe trabalhadora chilena e a juventude combatente, com uma decisiva participação das mulheres do povo, além da agenda contra o neoliberalismo, tomou para si a pauta anticolonial, atacando os símbolos do colonialismo e o povo Mapuche avança para um autogoverno autônomo. A dualidade de poder também se expressa nas assembleias populares autoconvocadas, baseadas na auto-organização territorial do povo trabalhador. Parlamentares da esquerda institucional são expulsos das praças por manifestantes, após tentarem salvar o governo com um acordo para uma Constituinte tutelada pelo regime reacionário.
O povo chileno faz sua própria história, após viver anos de uma brutal ditadura e de farsa democrática. A coragem e a incansável resistência popular foi precedida de anos de organização de base e trabalho militante de diversos movimentos populares combativos e organizações revolucionárias. A unidade popular que envolve mais de 140 organizações do povo garante a rejeição aos acordos entre as frações de poder para salvar o regime e a convocação unitária de uma sequência de paralisações da Greve Geral é outra chave do processo insurgente.
A rebelião também devolveu ao povo chileno a vontade de viver, a esperança na luta coletiva zerou os suicídios e são diversos os relatos de pessoas que superaram quadros de depressão participando das mobilizações, num país privatizado e vendido como modelo neoliberal na América Latina. A crise capitalista se aprofunda no mundo, a rebelião que sacudiu o Equador, prossegue com o heroico povo haitiano e agora vai tomando forma na Greve Geral da Colômbia e se iniciando no Panamá, tendo no Chile o seu maior bastião. A América Latina será a tumba do capitalismo. O povo é e sempre será o segredo da vitória.
ABAIXO A REPRESSÃO E O GOVERNO PIÑERA!
VIVA A INSURGÊNCIA DO POVO CHILENO E A REBELIÃO NA AMÉRICA LATINA!
TODO PODER AO POVO! PELO SOCIALISMO E AUTOGOVERNO POPULAR!
Casa da Resistência – FOB
agência de notícias anarquistas-ana
manhã de sol
sombra do pardal no poste
primeira visita do dia
Alonso Alvarez

[Chile] Santiago: 40º dia de Revolta Social

27 de novembro de 2019
QUE A MONOTONIA NÃO APAGUE A REVOLTA!
Já se passaram 40 dias, e nada de “agenda social”!
O presidente, que, segundo pesquisas apenas 9% da população o aprova, não avança um centímetro em soluções concretas para as demandas das ruas.
A comissão de parlamentares rechaça a acusação constitucional contra o ex-ministro do interior Andrés Chadwick, um dos principais responsáveis políticos pelas violações aos direitos humanos durante a Revolta Social.
A adesão à convocação para a GREVE GERAL foi massiva, mas não tanto quanto a de 12 de novembro. Desde o início, cem mil pessoas se reuniram na Praça da Dignidade e marcharam pela Alameda até Los Héroes, exigindo melhorias na aposentadoria, salários, saúde e educação.
Uma cena surreal ocorreu quando uma caravana fúnebre cruzou a “zona zero”, seus carros tiveram os vidros pichados com várias mensagens.
À tarde, caiu o número de manifestantes nos protestos; vários fatores podem explicar isso; o esgotamento, falta de locomoção para voltar para casa ou a monotonia das dinâmicas de resistência. Dá para se aprofundar neste assunto, mas este é apenas um pequeno “diário de bordo”.
Keny Arkana e Molotov são ouvidos em alto-falantes, enquanto panfletos anarquistas voam e a “linha de frente” enfrenta os lacaios. Eles prendem quatro encapuzados por carregar e atirar bombas incendiárias, drones e policiais civis infiltrados os seguiram e os prenderam a poucas quadras dos fatos.
Em plena Alameda, policiais pegam suas armas de serviço e ameaçam os manifestantes com tiros a alguns metros de distância.
No final do dia do protesto, uma multidão chuta um agente que ficou caído e estropiado no meio da Praça da Dignidade.
Pela segunda vez, a polícia tenta entrar no Posto Central de Urgência para prender os feridos.
Em San Bernardo, uma mulher chamada Fabiola está em coma induzido pelo impacto de uma bomba de gás lacrimogêneo que recebeu no rosto, de acordo com o Instituto Nacional de Direitos Humanos (NHRI) e a rádio Bio Bio. Ela perdeu a visão dos dois olhos, o nariz está quebrado e ela tem lascas metálicas no cérebro.
Em San Ramón, carabineiros disparam gás lacrimogêneo em um colégio e as crianças precisam fugir correndo. Na mesma comuna, desconhecidos incendeiam um ônibus e um supermercado Walmart.
Em Concepción e Iquique, os portuários bloqueiam os portos. Em Bio Bio manifestantes interceptam um caminhão e forçam o motorista a despejar sua carga na estrada com 20 toneladas de sardinha! Uma barricada é erguida.
A delegacia de Peñaflor é atacada com bombas incendiárias. Tropas da PDI (Polícia de Investigações do Chile) disparam contra manifestantes do lado de fora do shopping Portal Belloto, em Quilpue. O centro comercial foi alvo de expropriações coletivas.
Fogo em uma igreja ilumina a cidade de Curico. Manifestantes atacam o hotel e a Seremi (secretária de educação) em La Serena. Em San Antonio, manifestantes incendeiam a sede do jornal “El Lider” e uma agência AFP (sistema de aposentadorias do Chile). Ataque incendiário contra uma arena de maus-tratos a animais em Alto Hospicio.
Em Santiago, os motoristas do “NO + TAG” (contra pedágios) bloqueiam estradas interurbanas e estacionam na Avenida Kennedy, em frente ao shopping Parque Arauco. Uma marcha de estudantes no mesmo shopping localizado em Las Condes causa algumas brigas entre clientes e encapuzados. Estes últimos usam extintores de incêndio e comerciantes fecham suas lojas. Os ricos e os privilegiados estão sendo “perturbados por preguiçosos e tristes”.
Em várias partes, protestos simbólicos são praticados por estudantes do 4º ano do ensino médio, eles dão as costas para a bandeira enquanto o hino chileno é cantado.
O sindicato de jogadores de futebol decide entrar em greve e não cumprir a ordem da Associação Nacional de Futebol Profissional (ANFP) para jogar. O presidente da AzulAzul reitera as ligações entre a torcida “Los de Abajo” e os anarquistas.
Seguimos nas ruas…
Procurar novas estratégias de ataque e resistência!
REINVENTAR NOSSA DINÂMICA DE AÇÃO DIRETA DENTRO DA REVOLTA SOCIAL!
Fabiola Campillay, Gustavo Gatica e Dilan Cruz (Colômbia), isso também vai para vocês…
N.T.
Conteúdo relacionado:
agência de notícias anarquistas-ana
Ruídos dos carros,
os escuto pela mesma orelha
que os pássaros.
Robert Melançon

[Chile] Uma jornada sem retorno à nossa completa liberdade e dignidade

O surto social iniciado em 18 de outubro e a repressão desencadeada pelo Estado demonstraram o fracasso do modelo político chileno e de seu modelo econômico.
A origem de tudo isso vai além do governo contra o qual lutamos hoje, e a revolta que se espalhou após as evasões em massa realizadas por estudantes em dificuldades tem sua origem na fúria dos abusos apoiados e permitidos por décadas. Nada de bom pode surgir como resultado de dar ao Estado, políticos e autoridades a capacidade de decidir sobre nossas vidas enquanto tentamos sobreviver em um sistema que transforma nossas necessidades em negócios e nosso tempo no dinheiro que nos impuseram como a única maneira de conseguir o que precisamos.
Ao explodir as ruas e as consciências, muitas pessoas sentiram que, com a explosão de raiva, embarcamos em uma jornada sem volta à recuperação de nossa completa dignidade e liberdade. E no meio de tudo o que estamos experimentando pessoal e coletivamente, sabemos que há pessoas que, antes de 18 de outubro, já percorreram os caminhos da luta ancestral por uma vida livre sem um Estado ou autoridade.
Nessa caminhada, aprendemos que a medida do Estado de emergência com militares nas ruas e o toque de recolher decretado pelo governo de direita de Piñera é apenas parte do arsenal repressivo que todos os governos colocaram em prática de várias formas ao longo da história.
Rompendo com uma normalidade imposta por séculos
No Chile e no mundo, tortura, engano, assassinato, injustiça e reformas que não mudam nada estrutural fizeram parte da existência histórica do Estado como ferramenta de opressão em benefício de uma elite.
Antes, e também agora, no Chile, houve pessoas mortas, assassinadas, torturadas, aprisionadas, espancadas ou desaparecidas por causa da luta contra a ordem imposta ou apenas por causa de sua condição econômica, sexual ou étnica.
Uma sangrenta história de intervenção militar e policial circula em nossas veias para aniquilar revoltas e lutas sociais por uma vida digna e livre de opressão: o extermínio do povo mapuche, a Matança de Santa Maria de Iquique, a ditadura de Pinochet, o estado policial da democracia e agora também a repressão aguda contra a qual enfrentamos.
No entanto, nas últimas semanas, muito mais pessoas sentiram em si mesmas o papel opressivo do estado policial militarizado que já era evidente perseguindo há anos lugares como o Wallmapu, casas de okupas, populações combativas e escolas secundárias em luta contra quem o Estado declarou guerra há muito tempo.
Hoje, as autoridades mais uma vez protegem a ordem social, política e econômica que construíram para seu benefício e o fazem reprimindo nas ruas, enganando a imprensa e falando sobre um suposto inimigo que busca afetar a vida das pessoas.
Esse inimigo que eles mencionam é toda pessoa que luta e todo ato rebelde que se multiplica, buscando abrir caminho para maneiras de se relacionar, organizar e viver oposto àquelas que nos impuseram há anos.
Por essa razão, políticos, empresários e forças repressivas tentam nos convencer de que devemos ter medo da desobediência e revolta. Eles tentam nos fazer cair na armadilha de pensar que seus interesses e os nossos são os mesmos. Mas, ao contrário de outros momentos da história recente, hoje muitas pessoas não acreditam neles e continuam na luta.
É por isso que não esquecemos cada golpe, todo tiro contra nosso corpo e o de nosso povo próximo, toda mentira ou todo cúmplice que se posicionou a favor dos poderosos e de sua repressão.
Nem esqueceremos todo ato de rebelião, todo abraço e todo gesto de apoio entre companheiros, amigos e vizinhos. Essa memória e esses gestos de raiva, amor e rebelião fazem parte do cenário da vida e da luta que estamos construindo todos os dias.
A solução está em nossas mãos
No Chile, algo começou a mudar. Alguns acordaram antes, outros depois, mas a verdade é que, apesar da repressão, continuamos a seguir o caminho da vida com o qual decidimos romper.
Hoje somos mais que não queremos dar a ninguém, a não ser a nós mesmos, o poder de direcionar eventos e processos em direção a um horizonte de liberdade e dignidade. É por isso que sabemos que o que construirmos daqui em diante dependerá de nós e não estamos dispostos a dar aos outros a capacidade de decidir sobre nossas vidas.
Nem a esquerda oportunista nem a direita ditatorial. Nem a Frente Ampla nem qualquer partido político. Nem a renúncia de Piñera, nem novas eleições, nem uma nova Constituição. Nada do que vem da ordem estabelecida com a qual estamos rompendo pode nos dar uma solução.
Sabemos que muitas perguntas e preocupações sobre como continuar inundam muita gente agora. De nossa identidade anárquica de luta contra toda autoridade e do que experimentamos em contato com outras vontades no meio da revolta, descobrimos as respostas e ferramentas na experiência e aprendemos a tomar posições de combate no aprimoramento do conflito contra a ordem social que lutamos. Essas ferramentas e essas respostas são encontradas na multiplicação dos atos nos quais se expressam desobediência, apoio mútuo e ação direta.
Lutar juntos e nos apoiar diante dos efeitos da repressão e do medo da escassez causados pelo Estado, deixando nosso mundo pessoal e unindo forças com outras pessoas, contribuindo cada um de acordo com sua capacidade de agir e pensar em conjunto possibilidades de vida diferentes daquelas são respostas que temos forjado a partir da autonomia de não depender de ninguém, mais que de nossa vontade em ação.
Tudo isso foi experimentado por milhares de pessoas nas últimas semanas. Tudo isso e muito mais se desenvolveu sem líderes ou dirigentes.
A partir de agora, o que cada um de nós contribui influenciará o curso do que pode ou não acontecer.
Aconteça o que acontecer, continuaremos a lutar e conhecer todas as pessoas que continuam a experimentar e expandir a liberdade em todos os atos de revolta contra a ordem do dinheiro e da autoridade.
Não vamos desistir, não vamos recuar. Continuaremos a construir um novo mundo nas ruínas do sistema que estamos destruindo.
MULTIPLICAR DESOBEDIÊNCIA, APOIO MÚTUO E AÇÃO DIRETA!
VIVA A REVOLTA CONTRA TODAS AS FORMAS DE OPRESSÃO E AUTORIDADE!
Publicado originalmente em Confronto. Edição especial, outubro-novembro, região chilena, 2019
Tradução > Liberto
agência de notícias anarquistas-ana
Rosto no vidro
uma criança eterna
olha o vazio
Alphonse Piché

Share:

0 comentários:

Postar um comentário