Os brasileiros desde cedo se
acostumam com a falsa idéia de que a construção do Rio Grande do Sul é obra
exclusiva de imigrantes europeus. Isso porque a inestimável contribuição dos
negros permaneceu esquecida durante muito tempo pelos manuais de História. Tal
"invisíbilídade" também é patente no mundo físico, comenta o historiador Pedro
Rubens Vargas, do Museu Joaquim José Felizardo. Com exceção do espaço público
renomeado como Largo Zumbi dos Palmares - em homenagem recente ao ícone da
resistência antiescravista -, e um busto de João Cândido, líder dos marinheiros
rebelados na Revolta da Chibata, em 1910, Porto Alegre não tem monumentos, nomes
de ruas, nada que possa lembrar a presença multissecular e permanente dessa
etnia em solo gaúcho.
Mesmo na literatura
tradicional, o negro sempre apareceu quase como um objeto inanimado na paisagem.
Contudo, desde o passado mais remoto, escravos africanos e seus descendentes
estiveram em todas as expedições de conquista do território. Em meio a
violências e humilhações, sustentaram as atividades econômicas na antiga
província, da célebre indústria do charque ao comércio citadino. Trabalharam no
cais do porto, em atividades domésticas, e foram alugados por seus senhores,
comenta o antropólogo Losvaldyr Bittencourt Júnior, membro da comunidade negra.
Os negros também resistiram, infringindo regras que lhes eram impostas, fundando
quilombos e combatendo pela liberdade. Em Porto Alegre, na virada do século 19
para o século 20, com a regularização do traçado viário, a população pobre, em
boa parte negra, desapareceu do centro. Essa regularização suprimiu becos e
vielas, e foi seguida de medidas urbanísticas que impediram a permanência de
habitações feitas de madeira, com apenas um pavimento, na região
central.
Aos poucos, a trajetória
do povo negro está sendo resgatada no país. Com ajuda do Sul. A contestação ao
13 de maio, por exemplo, começou na Esquina Democrática de Porto Alegre. Ao
iniciar-se a década de 1970, intelectuais negros, que se reuniam ali, decidiram
transformar o 20 de novembro, aniversário do assassinato do Zumbi, em
data-símbolo, mais tarde denominada Dia Nacional da Consciência Negra. Também o
velho baú da história oficial vem sendo remexido para derrubar mitos e colocar
certos personagens em seus devidos lugares. É o caso do episódio da Revolução
Farroupilha, conhecido como Massacre de Porongos, no qual o líder farrapo David
Canabarro desarmou o corpo de lanceiros negros. Sem meios de defesa, a tropa foi
aniquilada durante ataque noturno, realizado pelo exército imperial, comandado
por Caxias.
Fonte:INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E
ARTÍSTICO NACIONAL (IPHAN). Praça da Alfândega: Porto Alegre-RS. Programa
Monumenta. Brasília: IPHAN, 2007. Série Preservação e Desenvolvimento. p.
81-83
Imagens:Negros Libertos. Acervo Fototeca Sioma Breitman
- Museu Joaquim José Felizardo. 1ª imagem de Virgílio Calegari, a 2ª e 3ª de
Lunara.
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