6 de nov. de 2017

Jorge Coli e a onda censória: “Esse pessoal quer botar o pensamento em uma camisa-de-força”. - Editor - IMBECIALIDADE, BRUTALIDADE, IGNORANCIA FILOSÓFICA, PASTEURIZACÃO CULTURAL, BURRICE CASTRADORA, MESMICE É O QUE ROLA NA CABEÇA DE IMBECIS, AMORDAÇADOS AO PURITANISMO CÍNICO, DO FAÇO O QUE EU MANDO E NÃO FAÇA O QUE EU FAÇO. TREMENDA FALSIDADE DE PRINCÍPIOS.

Jorge Coli e a onda censória: “Esse pessoal quer botar o pensamento em uma camisa-de-força”.

Em entrevista ao Nocaute, Jorge Coli, professor titular de História da Arte e da Cultura da Unicamp, fala sobre os recentes episódios de censura às artes no Brasil.

Jorge Coli: Eu estou muito contente por estar aqui com a Maria Bonomi, uma das maiores artistas brasileiras, e com a Lena Perez, que abriu essa galeria chamada TransArte, na qual estão sendo expostas obras da Bia Leite. A Bia Leite, que foi censurada na exposição do QueerMuseu de Porto Alegre, porque o Santander decidiu abreviar a exposição. Razões provocadas pela presença das pessoas que protestavam contra aquela mostra.
Lena Perez: Nessa censura da Bia Leite, não só a censura estava errada, como a interpretação da obra. Eles erraram completamente, eles acharam que ela estivesse sugerindo que a criança fosse viada, estimulando a criança a ser homossexual, quando na verdade ela estava elencando os xingamentos sofridos pelas crianças. Então, isso que é assustador, tem a burrice, a censura e a interpretação fora do contexto.
Jorge Coli: Quando o Fernando pediu para eu gravar este vídeo, ele lembrou de um episódio no qual eu fui censurado pela Academia Brasileira de Letras. Isso faz cinco anos. Eu estava fazendo uma palestra sobre a sexualidade nas artes e estava sublinhando o caráter conservador do nosso tempo. E mostrei aquele célebre quadro “A Origem do Mundo”, do Courbet, que expõe o sexo feminino. A palestra estava sendo transmitida pela internet e a Academia julgou que deveria interromper a transmissão. Porque aquilo era obsceno. Houve até um certo debate, apareceram coisas nos diferentes jornais a respeito da censura naquela época.
Só que aquele anúncio do conservadorismo que eu estava dando, fazia cinco anos, eu nunca poderia imaginar que ele se acelerasse de uma maneira tão rápida. Nós estamos vivendo um caos político, econômico, social e essas pessoas que têm essa visão mais fortemente conservadora estão se aproveitando dessa situação caótica para manifestarem as suas posições, em nome de um moralismo que é assustador.
Há uma coisa muito importante no processo reflexivo. Refletir é considerar o outro. Essas pessoas têm as suas convicções. O problema é que elas não toleram o outro, elas não consideram o outro, elas não querem as diferenças. E elas se manifestam hoje, se manifestam de maneira violenta. Eu não sei qual é a solução. Não sei como isso vai terminar, em todo o caso é absolutamente assustador. Vocês vejam, essa situação é tão grave que um museu como o MASP introjetou a censura.
O MASP tinha projetado uma exposição há mais ou menos dois anos, era naquela época para ser uma exposição sobre sexo, para atrair gente, um lado marqueteiro, e era também uma exposição que devia ser meio radical-chique, trazendo quadros do mundo inteiro.
Vejam como as coisas foram rápidas. Da concepção até a inauguração da exposição, passaram dois anos. E nesse meio de tempo, quando a exposição se abre, ela se encontra num clima de intolerância tal que o museu é obrigado, ou se sente obrigado, a proibir essa mostra para menores de dezoito anos.
É a primeira vez na minha vida que eu vejo numa livraria o catálogo da exposição com uma tarja escrita: proibido para menores de dezoito anos.
Arte é proibida para menores de dezoito anos neste país, isso é algo insuportável.
A exposição do MASP é muito frágil do ponto de vista conceitual, ela é uma espécie de reunião, um pouco desordenada, de obras em torno de um vago tema de sexualidade. Mas um dos pontos que aparecem, também, muito importantes, é o fato de que existe um setor nessa exposição que se chama “O Nu” – como se o nu fosse por si só algo sexualizado e erótico. Ora, nós sabemos que existem roupas eróticas e roupas não eróticas, da mesma maneira existem nus que são fortemente sexuados e nus que são perfeitamente castos.
A situação que ocorreu no MAM, é exatamente um nu de uma inocência completa. E o que aconteceu? Veio uma menina, que também é inocente, e tocou no pé desse homem, também nu. Portanto, o nu era inocente, a menina era inocente, onde é que está o mal? O mal está na cabeça das pessoas que viram e interpretaram aquilo.
É o cúmulo da ironia a gente imaginar que o Alexandre Frota, que tem a cabeça mais suja desse país, venha se escandalizar com alguma coisa que era tão pura e tão inocente.
Está claro que as pessoas vão ver as obras como elas querem. Elas não chegam a perceber o que há dentro das obras, não chegam a verificar o que é que as obras estão dizendo. Basta que apareça alguma coisa sexual para se horrível, horrendo.
Mas é preciso pensar e lutar contra isso. Lutar do ponto de vista cultural e lutar do ponto de vista político.
Há por trás disso, eu estou convencido, um projeto de poder. Aliás um desses pastores fundamentalistas publicou um livro chamado: “Projeto de Poder”, em que ele diz: “São quarenta milhões de crentes, se todos nós votarmos direitinho nós colocamos quem quisermos ali”.
Não tenho nada contra os crentes, desde que eles continuem e se limitem a suas crenças e às suas práticas. Mas eu tenho muita coisa contra pessoas que veem querer mandar em como eu devo pensar, o que eu devo ver e o que eu não posso ver. Isso é tremendo.
Então, eu acho que todo mundo tem que se levantar contra uma situação neste país, atualmente, assustadora. O que a gente constata é que as pessoas querem absolutamente neutralizar os poderes da arte, da cultura e do conhecimento. Querem burrice, querem limitação da inteligência, querem camisa-de-força para o pensamento. É isso o que eles querem.

http://www.nocaute.blog.br/brasil/12740.html

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