18 de mai. de 2018

“Projetos de mineração provocarão colapso social e ambiental na metade sul do RS” - Editor - SÃO 2.500 MUNICÍPIOS IMPACTDOS PELA MINERAÇÃO E UMA ARRECADAÇÃO VERGONHOSA, ALÉM DOS PREJUÍZOS AMBIENTAIS E HUMANOS.





Márcio Zonta
Marco Weissheimer
Os projetos de mineração de chumbo, zinco, cobre, titânio e outros minerais em uma área que vai da bacia do rio Camaquã até São José do Norte, caso sejam implantados, provocarão um colapso social e ambiental na região, afetando comunidades tradicionais de pescadores artesanais e agricultores familiares. O alerta é de Márcio Zonta, integrante da coordenação nacional do Movimento pela Soberania Popular na Mineração que esteve no Estado na semana passada para participar da manifestação organizada por moradores de São José do Norte contra o projeto de mineração de titânio numa área entre a Lagoa dos Patos e o Oceano Atlântico.
Em entrevista ao Sul21, ele fala sobre alguns dos riscos que correm as comunidades desta região: “Considerando as características do lençol freático da região de São José do Norte e da bacia do Camaquã, a possibilidade de contaminação é gigantesca. Além de problemas de saúde como câncer, abortos espontâneos e má formação de fetos temos os econômicos. Quem é que vai comer pescado ou alimentos contaminados? E a pesca vai continuar existindo depois que a mineração começar? Como é que fica a agricultura em caso de contaminação ou de falta da água?”- questiona.
Márcio Zonta também analisa o cenário da mineração no país, criticando recentes medidas aprovadas pelo governo de Michel Temer. “O código de mineração do Temer é pior que o dos militares de 1967, que ainda tinha alguma forma de protecionismo. O que temos agora é um código extremamente entreguista, o que se revela já na questão da taxação, que é a mais baixa do mundo”. Junte-se a isso, acrescenta, a flexibilização trabalhista, a destruição da natureza, a tentativa de se minerar em terra indígena e em terra quilombola, em um processo onde se burla qualquer possibilidade de proteção social, ambiental, cultural e econômica. Hoje, infelizmente, o Ibama virou um escritório das mineradoras”.
“Existem 2.500 municípios impactados pela mineração no Brasil”. (Foto: Guilherme Santos/Sul21)









Sul21Como surgiu o Movimento pela Soberania Popular na Mineração e quais seus objetivos?
Márcio Zonta: O MAM nasceu na Amazônia, no início dos anos 2010. Naquele momento, o projeto Grande Carajás avançava de maneira avassaladora por terras quilombolas, indígenas e ribeirinhas, atingindo o campesinato que se formou naquela região do Pará. Em 2012, realizamos uma reunião em Parauapebas com representantes de 12 estados e da sociedade local que vivia em conflito com a mineração. Uma das reflexões que fizemos naquele momento foi a de que nós não poderíamos criar um movimento regional, em função da potência e da correlação de forças favorável às mineradoras nos planos político e econômico. Se fizéssemos isso, seríamos aniquilados facilmente. Decidimos que teríamos que massificar essa organização para ter condições de atuar no conflito minerário brasileiro. Optamos, então, por lançar um movimento nacional. Ele nasceu na Amazônia e começou a se alastrar para outras regiões do Brasil.
Descobrimos que existem 2.500 municípios impactados pela mineração no Brasil. As empresas do setor mineram no país mais de 80 bens minerais todos os dias, que vão desde o ferro (principal na pauta de exportações brasileira) até o areal e a brita, com uso de trabalho semi-escravo. Elas empregam uma força de trabalho de quase três milhões de trabalhadores. Destes, menos de 500 mil estão protegidos pela CLT. A grande maioria, incluindo aí homens, mulheres, crianças, trabalhando em garimpos, nas cadeias do ferro e dos areais, entre outras. A Votorantim, para citar um exemplo, distribui sua produção para 14 países da América Latina, com uma cadeia de produção que envolve trabalho escravo e as condições mais precárias de vida. Temos pessoas trabalhando de dez a treze horas em areais, muitas vezes sem equipamento nenhum, para o produto chegar até a Votorantim, onde ele é ensacado, recebe os ISOs da vida e é distribuído para 14 países. Quando se tem um boom na construção civil, esse processo é intensificado ainda mais.
De 2012 para cá, nós construímos a organização em mais de dez estados nas regiões Norte, Nordeste e Sudeste. Neste momento, estamos chegando ao extremo sul do país pelas várias problemáticas que vão se apresentar envolvendo projetos que pretendem ser implantados na região do extremo sul do Rio Grande do Sul. Hoje, além dos empreendimentos já existentes, há 162 projetos de prospecção protocolados. Destes, mais de 100 estão localizados na metade sul do Estado.
Sul21: Qual é o quadro geral da atividade de mineração hoje no Brasil? O governo Temer vem tomando algumas medidas que favorecem ainda as empresas do setor. O que se pode esperar para os próximos anos?

Márcio Zonta: Nós mineramos há mais de cinco mil anos. O problema que enfrentamos hoje está relacionado ao advento do capitalismo, que remonta há cerca de 500 anos. O capitalismo financeiro começou a acumular muito também a partir da natureza, seja pela terra, pela água ou pelos minerais. Hoje, qualquer bem mineral intocado não dá lucro a esse capital. Por isso, ele precisa ser colocado em giro. Temos aí uma gama de acionistas que vai lucrar com isso, bancos em sua grande maioria, bancos norte-americanos, bancos suíços, bancos belgas, etc. O governo Temer, que é um governo golpista e entreguista, que compõe essa mentalidade da elite brasileira que tem um projeto virado pra fora, acirrou a questão da mineração.
A primeira polêmica mais expressiva foi a da Renca, uma reserva da região amazônica em relação à qual ele teve que voltar atrás. Mas, para além deste caso, tivemos o código da mineração fatiado. O código de mineração do Temer é pior que o dos militares de 1967, que ainda tinha alguma forma de protecionismo. O que temos agora é um código extremamente entreguista, o que se revela já na questão da taxação. A taxação dos minérios no Brasil é a mais baixa do mundo. Junte-se a isso a flexibilização trabalhista, a destruição da natureza, a tentativa de se minerar em terra indígena e em terra quilombola, em um processo onde se burla qualquer possibilidade de proteção social, ambiental, cultural e econômica.
Os indígenas, quilombolas e camponeses em geral têm sofrido uma pesada ofensiva e seus projetos estão sendo destruídos pelas mineradoras. Como a nossa Constituição diz que o subsolo sobrepõe o solo e a concessão é dada pela União às empresas, elas estão se aproveitando dessa situação. Hoje, infelizmente, o Ibama virou um escritório das mineradoras. Dificilmente o Ibama não aprova um projeto de mineração. Populações estão sendo expulsas de seus territórios porque o subsolo sobrepõe-se ao solo.
Sul21Isso já está ocorrendo inclusive em terras indígenas?
Márcio Zonta: Há uma tentativa neste sentido. Querem minerar em terra indígena, quilombola, área de proteção ambiental. A tentativa hoje é que todas essas áreas possam ser liberadas para mineração.
Sul21: O próprio fracking, que andava meio engavetado, parece que voltou aos planos…
Márcio Zonta: Sim, ganha força novamente, inclusive aqui no Rio Grande do Sul. Há notícias de projetos de fracking para o extremo sul do Estado, nas regiões de São José do Norte e da bacia do Camaquã. No Paraná e em Santa Catarina, as populações se organizaram e conseguiram barrar esses projetos. Mas ele ganha força de novo agora em várias regiões do Brasil, o que é muito preocupante pois o nível de destruição ambiental provocado por essa tecnologia é maior do que a provocada pela mineração em geral.
Sul21: Qual é o perfil do setor minerador que atua hoje no Brasil?
Márcio Zonta: Ele é, majoritariamente, multinacional. A Vale é um grande exemplo disso. Ela mudou recentemente de estatuto e hoje é constituída por uma gama de acionistas. Antigamente, o governo influía nela. Agora, a influência maior é a destes acionistas. Hoje, 50% do capital da Vale é ligado aos Estados Unidos. O restante é dividido entre diferentes acionistas internacionais com uma minoria de capital nacional. Na divisão internacional dos mercados de mineração, esses acionistas têm a América Latina, sobretudo o Brasil, e a África, sobretudo a África do Sul, como focos centrais de atuação. Os ingleses estão mais voltados para a África do Sul. Na nossa região, neste momento, há uma disputa entre China e Estados Unidos. Os chineses avançaram muito sobre as minas de ouro e isso está relacionado à disputa pela moeda mundial. Como os Estados Unidos emitem o dólar e controlam suas crises com a emissão da sua moeda, os chineses alargam o seu poder de moeda e o seu acúmulo financeiro através do ouro. Em função disso, hoje temos muito mais pesquisas na América Latina para a exploração de ouro do que qualquer outro mineral. Estamos vivendo neste momento uma nova corrida pelo ouro.
Sul21: Patrocinada conjuntamente pela China e pelos Estados Unidos?
Márcio Zonta: Sim. Se você pegar alguns dos últimos grandes conflitos da América Latina, eles estiveram ligados ao ouro. Essa corrida pelo ouro ocorre tanto por baixo quanto por cima, ou seja, tanto dentro dos garimpos quanto entre as multinacionais. Isso dá origem a conflitos armados, mortes e uma desgraceira social gigantesca.
Sul21: O MAM tem na sua denominação a palavra “soberania”, o que indica que não é contra a exploração mineral em si mesma. Qual o significado dela na agenda de lutas do movimento?
Márcio Zonta: Todas as sociedades mineraram e todas as sociedades vão minerar. O problema é que chegamos a uma situação na mineração onde o valor de troca se sobrepõe totalmente ao valor de uso, ao valor social do mineral. Tomemos o exemplo do minério de ferro de Carajás. É um minério que tem uma porcentagem altíssima de ferro, chegando a 30% na rocha. Você não acha isso em nenhum lugar do planeta. No período entre 2007 e 2011, quando a tonelada do minério de ferro chegou a valer 180 dólares, a Vale começou a intensificar o seu ritmo de mineração para elevar os seus lucros com o preço do minério lá em cima. Para onde foi esse minério de ferro da Vale? Em parte foi para a China que o utilizou para a construção de uma série de cidades, com capacidade para abrigar entre 300 e 400 mil habitantes, que até hoje estão vazias. São cidades, portanto, que não cumprem a função social da moradia. A matéria prima comprada da Vale foi colocada em movimento, o que gerou uma série de lucros, via capital financeiro e industrial.
“Crime de Mariana foi resultado do rebaixamento do custo operacional pelas mineradoras”.
(Foto: Antonio Cruz / Agência Brasil)
Neste período, Carajás exportou quase 180 milhões de toneladas métricas de ferro por ano. Poderia ter exportado apenas 30 milhões de toneladas, o que garantiria uma soberania popular nossa, um equilíbrio econômico e social da extração desse mineral e permitiria esse ferro fosse empregado em uma indústria nacional. Ao invés disso, nós mandamos para fora do Brasil um parque tecnológico que poderia estudar geologicamente as nossas reservas. Além disso, mandamos para fora uma série de empregos. O que ocorre hoje é que a plataforma de empregos e a plataforma tecnológica é da China.
Aí nós vamos chegar a Mariana. O que significou Mariana? Entre 2013 e 2015 temos uma queda do preço do minério de ferro que caiu de 180 dólares a tonelada para 50 dólares. O que as mineradoras fazem? Elas param de minerar? Não, pelo contrário. Elas intensificam o ritmo de extração mineral para manter a taxa de lucro que tinham até então. As pequenas quebram, pois o mercado mundial fica ainda mais monopolizado pelas grandes que intensificam o seu ritmo de trabalho. Há pesquisas que mostram que os trabalhadores do setor, hoje, trabalham em media oito vezes mais do que trabalhavam há dez anos. Com isso, vem junto o relaxamento de procedimentos de segurança operacional, a redução de salários e benefícios e o aumento da terceirização. A Vale é um exemplo disso. Ela trabalha com terceirização, quarteirização, quinteirização e até sexteirização, o que vai chegar ao trabalho semi-escravo, como aconteceu com a Anglo American em Minas Gerais. Além disso, para implantar o maior mineroduto do mundo, com mais de 500 quilômetros, saindo de Conceição do Mato Dentro e chegando ao porto do Rio de Janeiro, gasta-se uma quantidade de água diária equivalente ao consumo de uma cidade de 700 mil habitantes.
Com o custo operacional rebaixado, aumenta o número de acidentes de trabalho, de mutilações, doenças físicas e mentais. Não é à toa que, hoje, em Minas Gerais, a atividade mineradora mata quase quatro vezes mais do que qualquer outra atividade empregatícia. Vira uma máquina de comer gente, comer minério e comunidades inteiras. Levando em conta o conceito de soberania, teríamos que discutir hoje, junto com a população, que ritmo de extração precisamos ter no país, para qual destinação e em que condições sociais e ambientais.
Também é preciso discutir que áreas devem ficar livres de mineração. Vamos tomar o exemplo de São José do Norte. Se você pegar a planta de lavra e a planta de beneficiamento da empresa, verá que ela abrange praticamente todo o município. Isso inviabilizaria as atividades dos pescadores, dos agricultores e qualquer outra forma de atividade econômica associadas a eles. Ou seja, teríamos uma cidade com um distúrbio social gigantesco, na medida em que ela deixaria de representar um papel social que garantia a reprodução dela. Às margens desse projeto de mineração, teríamos uma gama de miseráveis. Portanto, essa área deve ser livre de mineração.
“Se você pegar a planta de lavra e a planta de beneficiamento da empresa, verá que ela abrange praticamente todo o município de São José do Norte”.
Também precisamos discutir, especialmente com a classe trabalhadora, como é que você sai do pensamento economicista. Todo mundo quer melhores salários, mas como é que você abaixa o ritmo de morte na mineração? Isso está ligado a um ritmo enlouquecido de trabalho. Como é que se implanta um trabalho na mineração que seja baseado numa produção atrelada à economia brasileira e não as demandas internacionais, sobretudo pela especulação dos acionistas, e uma plataforma tecnológica para desenvolver esse mineral aqui no Brasil, aqui na América Latina? A soberania passaria por esse esqueleto, mas infelizmente o povo brasileiro está alijado desse debate.
Sul21: Quais são os instrumentos que a população de uma comunidade atingida têm hoje para enfrentar essas empresas poderosas?
Márcio Zonta: Existem alguns dispositivos legais que ela pode utilizar, como audiências públicas e questionamento dos laudos das mineradoras junto ao Ministério Público Estadual e Federal. Outro braço para resistir a esse processo é organizar a população para lutar contra esses projetos. Em nível de América Latina, temos exemplos desse tipo de resistência em países como Argentina, Guatemala e Peru. Os peruanos estão segurando há cinco anos um projeto de mineração de ouro dos Estados Unidos, a custa de muito sangue, prisões e judicializações. Mas estão conseguindo freá-lo. Esse trabalho de massificação da luta tem que acompanhar o braço institucional. O processo minerador é, historicamente, extremamente violento. Você não consegue revertê-lo somente pela via institucional porque ele burla esse caminho e atua de forma violenta dentro das comunidades.
Sul21: Qual é o tamanho da ofensiva mineradora no Rio Grande do Sul?
Márcio Zonta: Como eu disse antes, temos hoje no Rio Grande do Sul, além do que já existe, 162 projetos de prospecção requeridos pelas mineradoras que envolvem chumbo, zinco, titânio, cobre, ouro, prata, entre outros minerais. Mais de cem desses projetos estão localizados na metade sul do Estado. Na região entre Caçapava do Sul e São José do Norte, temos dois projetos – um da Votorantim em parceria com uma mineradora internacional e outra de uma mineradora canadense que usa o nome de Rio Grande – que se encontrariam no porto de Rio Grande. Mas eles não se encontram apenas no porto. Considerando as características do lençol freático da região de São José do Norte e da bacia do Camaquã, a possibilidade de contaminação é gigantesca. Além de problemas de saúde como câncer, abortos espontâneos e má formação de fetos temos os econômicos. Quem é que vai comer pescado ou alimentos contaminados? E a pesca vai continuar existindo depois que a mineração começar? Como é que fica a agricultura em caso de contaminação ou de falta da água?
Caminhada contra o projeto de mineração de titânio em São José do Norte. (Foto: Divulgação)
Se esses dois projetos se efetivarem, isso provocará, no curto prazo, o colapso social, ambiental e econômico daquela região. São projetos que duram vinte ou trinta anos, no máximo. Eles sabem que não podem minerar muito tempo naquela região por suas características geológicas e geográficas. O que eles trazem de bom para a população dessas regiões? Nada. Segundo estimativa feita por pesquisadores da Universidade Federal de Rio Grande, a Votorantim pagaria de CFEM (Contribuição Financeira pela Exploração de Recursos Minerais) a soma de R$ 250 mil reais por mês. O que uma prefeitura faz com R$ 250 mil reais por mês diante da problemática social que esses projetos trazem? Haverá crescimento da demanda por saúde, por moradia, escolas e assim por diante. Isso sem falar do impacto da destruição de comunidades produtivas tradicionais de pescadores e pequenos agricultores.
A mineração só emprega no momento em que ela implanta o projeto. Passada a implantação, como as empresas trabalham com maquinário intensivo a mão de obra tende a desaparecer. Há mineradoras que não empregam mais do que 40 ou 50 pessoas. Há projetos de mineração em Carajás em que o indivíduo nem entra na floresta. Ela controla por computador a extração do minério da cava que é transportado por uma esteira para fora da floresta. Então, é uma falácia dizer que a mineração gera empregos. Quando gera é de forma extremamente precarizada, com terceirizações, quarteirizações e assim por diante.
Mas há uma resistência popular interessante na metade sul e esperamos que ela vá ganhando vigor e consiga frear esses dois projetos extremamente destrutivos para toda aquela região.
Sul21: Você poderia citar alguns exemplos de regiões no país que estão sofrendo a confluência desses impactos sociais, econômicos e ambientais provocados pela mineração?
Márcio Zonta: Um exemplo muito bom disso é o caso da febre amarela na região de Mariana. A Vale e a Samarco, que não foram punidas, distribuíram esta semana cerca de 800 milhões de dólares para seus acionistas. Enquanto isso, já tivemos mais de 50 mortes por febre amarela em Minas Gerais, principalmente na região que é o epicentro do crime de Mariana. Esse é um exemplo de impacto ambiental gigantesco atrelado à mineração. Temos outro tipo de impacto, bastante comum no Maranhão, Goiás e no Pará, por exemplo, onde as nascentes de rios começam a secar. O capital chinês e o capital norte-americano estão instalados hoje em Catalão, a 300 quilômetros de Brasília, explorando nióbio. A cidade tem hoje o maior índice de câncer do estado de Goiás. Um estudo da Universidade do Mato Grosso diz que esse câncer é, essencialmente, digestivo e do sistema respiratório. A comida está contaminada e o ar também. A região ainda tem o pólo mineroquímico que beneficia fosfato. E as mineradoras de lá estão há dez anos sem pagar o CFEM. Devem mais de R$ 200 milhões para o município.
É importante assinalar que as mineradoras não são apenas empresas de mineração. Elas são também empresas de propaganda e militares. Quando elas estão para se instalar em uma região, elas mobilizam um aparelho propagandístico gigantesco de convencimento. E se não convencem entra a base militar dela. As mineradoras têm centros de inteligência empresarial, empregando ex-militares do Exército como espiões , que passam a espionar movimentos ambientalistas, movimentos sociais, ONGs, religiosos e todos aqueles que se opõem a seus interesses nas comunidades. Elas começam a judicializar toda região fazendo uma série de queixas-crimes contra essas pessoas e movimentos. Se acontecer qualquer coisa naquela região, essas pessoas e organizações serão responsabilizados, o que pode envolver multas e prisões. Se isso não der resultado, há também o nível da pistolagem pura e simples.
Sul21: Há algum tipo de documentação ou registro que comprove esse tipo de atividade?
Márcio Zonta: Há um caso famoso, ocorrido em 2013 envolvendo um ex-funcionário da Vale, chamado André Luis da Costa Almeida, que fazia parte da inteligência corporativa da mineração e teria gastado um pouco mais do que poderia no cartão corporativo da empresa e acabou demitido. Ele entregou então para o Ministério Público Federal um dossiê relatando a espionagem que a Vale fazia em todo o Brasil. Essa espionagem tinha como alvo desde altos dirigentes da própria empresa, para saber que tipo de informação detinham, até lideranças sociais. Ela envolveu, entre outras práticas, a infiltração em movimentos sociais e o pagamento de propinas a servidores da Polícia Federal e de órgãos da Justiça em São Paulo. Existe um filme chamado Buraco do Rato, que conta essa história (ver vídeo abaixo).

Disponível em https://www.sul21.com.br/areazero/2018/02/projetos-de-mineracao-provocarao-colapso-social-e-ambiental-na-metade-sul-do-rs/



Mineração 6
Exploração de minérios traz mais perdas que ganhos e enfraquece a conservação de áreas naturais, afirmam especialistas.
A reportagem é publicada por EcoDebate, 04-09-2017.
Após a decisão do Governo Federal, na última segunda-feira (28), de revogar o Decreto número 1.942 e editar um novo, especificando as áreas que serão exploradas pela mineração na Amazônia, o assunto voltou à tona com força. Nas últimas duas semanas o maior bioma do Brasil tem sido foco de notícias e especulações, e de muita preocupação por parte da sociedade. No entanto, o que pouco tem sido falado são as reais consequências dessa decisão, não só ambientais, mas também sociais e econômicas.
Em uma área equivalente ao Estado do Espírito Santo, com 46,5 mil km², a Reserva Nacional do Cobre e seus Associados (Renca) terá espaço suficiente para abrigar impactos que grande parte da população desconhece. Segundo o economista, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza e coordenador do Grupo de Economia do Meio Ambiente (GEMA) da UFRJCarlos Eduardo Young, o primeiro problema é a falta de debate com a sociedade, entre muitos outros. “A mineração pouco contribui para a inclusão social, pois são poucos os empregos locais gerados. Os trabalhadores que chegarem na região trarão junto problemas clássicos desse tipo de empreendimento: doenças, violência, alcoolismo, prostituição e ruptura de estruturas sociais nas comunidades estabelecidas”.
Outra questão levantada por Young é o modelo seguido pela economia brasileira, cada vez mais dependente da agropecuária e da mineração. “Estamos buscando matérias-primas e energia sem considerar os custos socioambientais. Isso reforça a exclusão social, pois os benefícios são concentrados em um pequeno grupo de pessoas, mas a degradação ambiental é deixada para todos nós, sem distinção”, ressalta o economista, que faz uma análise ampla do governo: “a visão (falaciosa) de que crescimento econômico e preservação ambiental são essencialmente antagônicos ainda prevalece junto aos tomadores de decisão”.
Junto a essas ações, o meio ambiente também será fortemente atingido, direta e indiretamente. A necessidade da construção de vias para escoamento mineral e rodovias para acesso aos locais de exploração poderão causar grande impacto em áreas de floresta hoje altamente preservadas.
De acordo com o engenheiro agrônomo, coordenador de Ciência e Informação da Fundação Grupo Boticário de Proteção à NaturezaEmerson Oliveira, por mais que exista a promessa de que as duas Terras Indígenas e as sete Unidades de Conservação localizadas na Renca não sejam exploradas, elas irão sentir, de alguma forma, as consequências dessa atividade. “Quando começarem os trabalhos de mineração, tanto a ocupação humana como o escoamento dos recursos vão, sim, afetar a biodiversidade local. O impacto ambiental será inevitável e significativo, não resta dúvida”, afirma.
A primeira ação, de acordo com o Governo, será de pesquisa e levantamento do potencial da região. Estudos geológicos preliminares indicam que a área é rica em ouro, manganês, ferro e outros minérios de alto valor econômico. Oliveira lembra que para a mineração do ouro, por exemplo, é utilizado mercúrio no processo do garimpo, elemento altamente tóxico e cancerígeno, cuja utilização pode comprometer toda a cadeia de organismos aquáticos que, por sua vez, acaba consumida por predadores e até mesmo pelas pessoas. Isto é, como o peixe é base da dieta na região, a sua contaminação coloca em risco a saúde dos ribeirinhos, dos indígenas e até mesmo da população urbana da região. “Não existe atividade de mineração como essa sem impacto, ainda mais no interior de formações florestais especialmente frágeis e complexas como as que ocorrem naquela região, variando desde áreas montanhosas até planícies e ecossistemas de várzeas e igapós”, analisa.
Metas cada vez mais distantes
Brasil e outros mais de 150 países ratificaram o Acordo de Paris de 2015 e se comprometeram a reduzir a emissão de gases que intensificam o aquecimento global. Uma das metas dos compromissos nacionais é zerar o desmatamento ilegal na Amazônia até 2030, objetivo que, na opinião de André Ferretti – gerente da Fundação Grupo Boticário, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza e coordenador geral do Observatório do Clima –, é importante mas não suficiente. Ele pontua dois principais motivos para essa insatisfação: “O primeiro é que não podemos esperar até 2030 e passar mais 13 anos perdendo a riqueza natural da Amazônia; só de agosto de 2015 a julho de 2016 foram 7.893 km² desmatados. Segundo, o melhor para a sociedade brasileira é acabar com a degradação de todos os biomas, incluindo o Cerrado que tem atualmente taxas de desmatamento acima das da Amazônia”, pontua André.
O ideal é que os países comprometidos promovam mudanças para que o aumento da temperatura na terra não supere 1,5°C. O Brasil foi protagonista nas negociações que concretizaram o Acordo de Paris e se comprometeu a reduzir em 37% as emissões de gases de efeito estufa até 2025; 43% até 2030, em relação às emissões de 2005; e zerar o desmatamento ilegal na Amazônia até 2030, meta essa que não parece estar sendo cumprida. De acordo com Ferretti, com as constantes reduções de áreas protegidas e o aumento do desflorestamento, o Brasil está longe dos objetivos assinados no Acordo de Paris. “A relação entre o desmatamento, a floresta e o clima é real e nos afeta diariamente. Não podemos perder o trem da história, pois o custo será o futuro de nossa e das próximas gerações”, analisa.
Sobre a Rede de Especialistas de Conservação da Natureza
Rede de Especialistas de Conservação da Natureza é uma reunião de profissionais, de referência nacional e internacional, que atuam em áreas relacionadas à proteção da biodiversidade e assuntos correlatos, com o objetivo de estimular a divulgação de posicionamentos em defesa da conservação da natureza brasileira. A Rede foi constituída em 2014, por iniciativa da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.

Disponível em http://www.ihu.unisinos.br/571352-mineracao-na-amazonia-os-impactos-sociais-e-ambientais-que-nao-se-pode-deixar-de-lado


Mineração 6
O recente estudo realizado pela Rede Latino- Americana sobre Dívida, Desenvolvimento e Direitos (Latindadd), em parceria com o Instituto Justiça Fiscal do Brasil, chamado “Subfaturação no Setor de Mineração no Brasil Evade US$ bilhões do Orçamento Público”, mostrou o modus operandi das mineradoras que atuam no Brasil para aumentar ainda mais seus exorbitantes lucros.
Evasões Fiscais, desvios e sonegação de impostos e, principalmente, transferência da renda pública gerada pela atividade mineradora para os capitais privados de empresas nacionais e transnacionais do ramo, seria um método utilizado corriqueiramente no país.
O estudo aponta um déficit de US$ 2 bilhões deixados de arrecadar para o povo brasileiro com a exportação de minério de ferro por tais práticas ilícitas só no estado de Minas Gerais.
Entretanto, juntado a Lei Kandir, promulgada nos anos de 1990 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, que isenta as mineradoras de tributos as operações relativas à circulação de mercadorias e serviços (ICMS), principalmente destinados à exportação, soma-se ainda em Minas Gerais nos últimos vinte anos uma desoneração aos cofres público de um montante próximo de R$ 135 bilhões de reais.
O Pará, no mesmo período, o segundo estado minerador depois de Minas Gerais, a Lei Kandir provocou um rombo nas contas públicas de aproximadamente R$ 25 bilhões de reais, num Estado onde habitam 8 milhões de pessoas e mais de dois milhões vivem abaixo da linha da pobreza.
“Podemos dizer que está em curso no Brasil além de um saque de minerais promovidos pelas transnacionais,  o objetivo de se apropriar dos recursos públicos para ampliar a capacidade de acumulação capitalista dessas empresas”, comenta Caroline Gomide, Geóloga e professora da Universidade Nacional de Brasília (UNB).

A Amazônia é o jardim do quintal

A mineração na Amazônia Brasileira é a face mais perniciosa na teia de relações de  apropriação de renda pública pelo capital privado das mineradoras, além do esquema de venda de minérios mais baratos para subsidiárias das próprias empresas para outros países para obter vantagens lucrativas e sonegar impostos.
Pesquisas do Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC) apontam vários fatores dessa trama, pois os valores agregados dos incentivos concedidos entre 2007 e 2014 pela SUDAM (Superintendência de Desenvolvimento na Amazônia) alcançaram R$ 16,5 bilhões destinados paras as mineradoras.
A Mineração Rio Norte é um claro exemplo: considerando uma estimativa do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica devido em R$ 16,12 milhões, é possível concluir que os incentivos recebidos pela empresa para explorar bauxita em Oriximiná, no Pará, somam valor próximo a R$ 12 milhões ao ano. Em dez anos, tempo da concessão do incentivo, esta mineradora adicionaria em torno de R$ 121 milhões de recursos públicos ao seu capital.
A Mineradora Rio Norte não é apenas um capital brasileiro, ela é subsidiaria das maiores mineradoras do mundo: Vale 40%, Alcoa 20%, CBR 10%  BHP Billiton 13%; Rio Tinto 12% e Hydro 5%.
Todas essas empresas lucram, portanto, através do conhecido transfer pricing (quando a empresa vende para outra coligada dela fora do país a um preço abaixo do mercado), como já mencionado pela documento da (Latindadd).
“Na Amazônia se ganha muito para as empresas minerarem”, diz Jorge Neri do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM) de Parauapebas -PA.
Apenas a Vale abocanhou 70 % do valor de R$ 506,96 milhões que foi distribuído para as mineradoras que atuam na Amazônia via SUDAM entre 2007 e 2012. Injetados na espoliação altamente lucrativa do ferro e cobre, por exemplo, de Carajás.
O caso emblemático de Catalão (GO)
Um dos casos mais emblemáticos de sonegação do principal imposto em contrapartida da atividade mineral, Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CEFEM), ocorre no município de Catalão, interior goiano, a 300 quilômetros da capital federal.
Lá onde está uma grande parte de reserva de nióbio do mundo, além da exploração de fosfato, as mineradoras não pagam a CEFEM há dez anos, desde que a Prefeitura moveu um processo contra as mineradoras em 2007, para cobrar devidamente pelo imposto, que já era sonegado pela Vale Fertilizantes e Anglo American.
Estima-se que a dívida chegue a quase 100 milhões de reais. “Dinheiro que daria para fazer muita coisa, como construir um hospital decente para cidade, creches, moradias populares”, cobra Jarbas Vieira, militante do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração.
Sem pagar devidamente o CEFEM, as mineradoras ainda foram notificadas por uma multa no valor de R$ 28 milhões. De acordo com a Secretária de Meio Ambiente de Catalão (SEMMAC), ambas as empresas seriam as responsáveis pela poluição que em Catalão já foi apelidada de “cheiro de baratas”. Entretanto, a multa aplicada em fevereiro de 2015 foi ignorada pelas mineradoras que não pagaram até o momento o valor cobrado pela Prefeitura.
A contaminação do ar e do solo causado pelas mineradoras levou Catalão, segundo estudos realizados pelo Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), a ser a cidade com maior incidência de câncer no estado de Goiás.
Segundo levantamento do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), Catalão seria apenas um dos municípios em que a Vale não paga a CEFEM. O órgão acusa a mineradora de dever cerca de R$ 5 bilhões sonegados constantemente no pagamento do imposto.
Agregados da construção civil
Por fim, outro caso escandaloso está ligado ao grupo Votorantim. Uma das famílias mais ricas do país, produz em média 26 milhões de toneladas de cimento no Brasil e na América do Norte e vende brita e areia para 17 estados brasileiros. Além de ser um dos principais responsáveis pela exploração de areais e cascalho na América Latina.
No entanto, a sonegação da CEFEM seria uma recorrente quando da exploração dos chamados agregados da construção civil, além de uma cadeia produtiva movida por um mercado de trabalho extremamente precarizado.
“No Brasil diariamente são minerados mais de 80 bens minerais em mais de dois mil e duzentos municípios, porém estima-se que aproximadamente mil e duzentos municípios minerados não recebam a CEFEM, sobretudo esses ligados a construção civil, principalmente pela fata de fiscalização dos órgãos  responsáveis”, expõe Lourival Andrade do Instituto Brasileiro de Educação, Integração e Desenvolvimento Social (IBEIDS).
Seja em Minas Gerais, no Pará ou no Goiás, os três principais estados mineradores atualmente, a prática permanece a mesma. “Precisamos mudar essa relação das mineradoras com o setor público, e fazer garantir que o povo ganhe com esse recurso que é finito e pertence ao povo brasileiro”, conclui Jarbas Vieira.

Disponível em http://mamnacional.org.br/2017/08/15/as-varias-faces-do-super-faturamento-das-mineradoras-no-brasil/


Mineração 7
Mineradoras triangulam exportações de minério de ferro, e provocam perdas anuais, estimadas em estudo inédito
por Alessandra Mello, no Estado de Minas em 07-08-2017
O Brasil deixa de arrecadar US$ 2 bilhões por ano devido à falta de fiscalização e controle das exportações de minério de ferro, estrela da pauta de vendas do país ao exterior. É o que aponta um estudo feito pela Rede Latino-americana sobre Dívida, Desenvolvimento e Direitos (Latindadd) em parceria com o Instituto de Justiça Fiscal (IJF). Inédito, o levantamento apontou subfaturamento de US$ 39,1 bilhões nos embarques da matéria-prima entre 2009 e 2015. A cifra representa perda média de receitas fiscais da ordem de US$ 13,3 bilhões no mesmo período, o correspondente a cerca de R$ 42 bilhões, quase a metade do orçamento de Minas Gerais para 2017.
No caso do Brasil, esse impacto é grande, pois a economia mineral tem participação bastante relevante nas exportações do país. As vendas externas de minério representaram em 2015 11,7% do comércio total do
Brasil com o exterior. Só o minério de ferro foi responsável por 7,4% da receita das exportações naquele ano, segundo dados do Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM), que representa o setor.
De acordo com a diretora administrativa do IJF e auditora fiscal da Receita Federal Maria Regina Paiva Duarte, o mecanismo usado para burlar a tributação consiste em vender o minério por um preço mais baixo para uma mesma empresa do grupo exportador, mas localizada em paraísos fiscais ou países em que a tributação é menor, e depois vender novamente, então pelo preço de mercado, para uma terceira empresa.
“Em geral, a mercadoria é vendida para um desses territórios, a preço menor que o que seria adequado, mas entregue em outro. A mineradora Vale, por exemplo, tem empresa na Suíça e o minério é vendido para lá, mas entregue na China. A perda de tributação se dá a partir dessa venda por preço inferior, o que reduziria o lucro tributável no Brasil e, por consequência, a base de cálculo sobre a qual vai ser cobrado o tributo”, diz Regina Paiva. Até os países desenvolvidos, de acordo com a auditora fiscal, estão tentando barrar essas operações, porque se deram conta que as grandes empresas não estavam tributando os lucros adequadamente.
Na avaliação de Regina Paiva, os países para onde o minério brasileiro é destinado inicialmente deveriam dar publicidade aos dados das operações realizadas, acabando com o sigilo das transações entre empresas vinculadas. Para ela, coibir essa fuga de capitais e, consequentemente, a perda de receitas requer que, as administrações tributárias estejam preparadas em termos tecnológicos e de recursos humanos, com fiscalização adequadamente remunerada, a fim de fazer frente ao planejamento tributário abusivo das empresas.
Ela defende também a criação de um organismo supranacional que regulamente essas operações, vinculado a ONU (Organização das Nações Unidas). Caberia a ele “implementar regras que permitam aos países, especialmente os menos desenvolvidos, arrecadar o que é justo, adotar métodos que permitam apurar os preços efetivamente praticados entre empresas vinculadas ou que envolvam guaridas fiscais e criar mecanismos severos de punição ou sanção a países e empresas que não cumpram as regras estabelecidas e pratiquem operações fraudulentas”, afirma a diretora do IJF.
RECURSO FINITO
Com base no estudo, estima-se que 70% de todo o comércio exterior brasileiro ocorra entre empresas vinculadas ou com subsidiárias em guaridas fiscais. “O agravante das mineradoras é que elas trabalham com um recurso não renovável e que pertence legalmente a toda à sociedade. Ou seja, o que uma mineradora extrai e exporta, desaparece. Não poderá mais ser extraído, é colheita única. As gerações futuras não terão mais como explorar este recurso”, afirma Dão Real Pereira dos Santos, diretor de relações institucionais do IJF e também auditor da Receita Federal.
Além de ser um recurso finito, destaca Dão, o minério constitui a principal matéria-prima para a indústria estrangeira. “Então, qualquer sonegação que o setor extrativo produz tem um efeito muito mais grave do que qualquer outro setor, pois é uma riqueza que se perde e uma redução de custos para a indústria estrangeira em detrimento da capacidade do Estado para promover políticas públicas, inclusive aquelas que possam viabilizar alternativas econômicas que compensem a falta do recurso extraído”.
Tonelada sai por metade do preço
Rosiane Seabra, advogada e consultora tributária da Associação Mineira dos Municípios Mineradores (AMIG), diz que o estudo realizado pela Latindadd em parceria com o Instituto de Justiça Fiscal comprova em números o que a entidade há muito vem denunciando. “Essa é uma operação feita pelas mineradoras com o intuito exclusivo de reduzir a tributação. Os municípios mineradores há muito denunciam essa prática”, relata. Segundo ela, a maioria das empresas vende para elas mesmas a tonelada de minério pela metade do preço, reduzindo assim a tributação. Para Rosiane, a única solução seria uma rigorosa fiscalização por parte dos órgãos federais.
O governo já chegou a multar grandes mineradoras por essa prática, mas ela continua ocorrendo e não há controle rigoroso sobre a s vendas externas. “É que o governo federal, quando tem muita tibrutação não fiscaliza com rigor”, afirma.
Ela lembra que, além desse subfaturamento das exportações, o governo federal ainda reduziu, com a Lei Kandir, os tributos para o embarque de minério ao exterior, prejudicando ainda mais os estados mineradores, que brigam na Justiça com a União para ter compensação pela perda de receitas com a desoneração. A Lei Kandir previu compensação aos estados e municípios por perdas decorrentes da isenção do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) nas vendas ao exterior. “O governo desonera a exportação de minério e ela ainda é subfaturada”. O Ibram foi procurado pela reportagem do Estado de Minas, mas de acordo com a assessoria de comunicação da entidade, seus dirigentes estavam em um evento externo e ninguém foi localizado para comentar o estudo.

Vale
LATINDADD, em conjunto com o Instituto Justiça Fiscal do Brasil, elaboraram um estudo que analisa os fluxos financeiros ilícitos no setor de mineração no Brasil, encontrando evidências de como as empresas extrativas aplicam práticas de evasão fiscal e remetem os lucros para territórios com baixa ou nenhuma carga tributária.
Baixe o estudo a partir deste link.
Entre as principais conclusões, eles disseram: “Na verdade, os poucos estudos sobre o tema sobre o caso do Brasil indicam que a fuga de capitais e a faturação comercial são um grande problema para o país.Este achado é corroborado pelos resultados deste estudo, que encontrou grandes perdas com a fuga de capitais ainda que incidindo sobre a exportação de um único produto“.
Estima-se que o subfaturamento nas exportações de minério de ferro produziram a fuga de US$ 39,1 bilhões entre 2009 e 2015, uma perda média de mais de US$ 5,6 bilhões por ano. Ao valor subfacturado foi associada uma perda de receitas fiscais de US$ 13,3 bilhões para o mesmo período, o que representa uma perda média anual de US$ 1,9 bilhão.”
Este estudo foi apresentado por Rodolfo Bejarano, coordenador da pesquisa na LATINDADD, ao participar na Mesa Redonda sobre Tributação Internacional, realizada no início de julho, em Cartagena, Colômbia, evento organizado pelo Centro Interamericano de Administrações Tributárias (CIAT).
A preparação do estudo foi patrocinado pela Transparência Coalizão Financeira (FTC) e o apoio da Tax Justice Network na América Latina e no Caribe. O estudo foi desenvolvido pelo Instituto Justiça Fiscal.

http://ijf.org.br/?tag=mineracao

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