Chile condena torturadores; no Brasil, “Ustra vive”

O juiz chileno Miguel Vazques, da Corte de Apelações de Santiago condenou oito oficiais do Exército chileno, hoje na reserva, a 18 anos de prisão pelos assassinatos do ex-diretor do Serviço de Prisões, Littre Quiroga e do cantor Victor Jara, no Estádio Nacional do Chile, a 15 de setembro de 1973, quatro dias depois do golpe do general Augusto Pinochet que derrubou e matou o presidente Salvador Allende.
Segundo os autos do processo, Quiroga se apresentou, a 11 de setembro, à Direção Geral de Prisões, em Santiago, ao saber que seu nome constava de uma lista de denunciados. A seguir foi conduzido ao Regimento Blindados No. 2, onde foi torturado e encaminhado ao Estádio Nacional.
No mesmo 11 de setembro, a Universidade Técnica do Estado, também na capital chilena, foi cercada pelo Regimento Arica do Exército, comandado pelo capitão Marcelo Moren Brito.
No dia 12, os militares invadiram o prédio para prender, indiscriminadamente, dezenas de alunos e professores, dentre os quais, Victor Jara.
Conduzido ao Estádio Nacional, Jara teria o mesmo tratamento dispensado a Quiroga. "Ambos sofreram em seu cativeiro constantes e violentos episódios de agressão física e verbal por parte dos oficiais do Exército ali presentes", consta na peça acusatória.
No dia 15 de setembro, Jara e Quiroga foram escoltados a um dos vestiários do estádio, onde, ainda segundo os autos "logo foram assassinados, o que se produziu com 44 e 23 impactos de bala, respectivamente, todos de calibre 9,23 mm, segundo informações da autópsia e dos exames balísticos, o que corresponde ao armamento que era utilizado pelos oficiais do Exército que estavam naquele recinto. Seus corpos foram jogados na via pública e encontrados, perto do Cemitério Metropolitano, por moradores da região".
Quando essa barbárie acontecia no Chile também havia ditadura militar no Brasil. Eu soube da morte de Allende no X-5 do DOI-Codi, na rua Tutóia, em São Paulo, onde estava preso desde 4 de setembro, lendo, escondido no banheiro, o "Jornal da Tarde" com o qual minha mãe embrulhava a panela com a minha dieta macrobiótica, a fim de mantê-la quente, pretexto graças ao qual ela foi autorizada a trazer meu almoço caseiro diariamente, que eu dividia com meu companheiro de cela, tal era a quantidade e, sem intenção, contrabandear o jornal do dia para mim, que estava incomunicável.
Dois anos depois, o jornalista Vladimir Herzog foi encontrado morto no mesmo X-5 onde eu passei 45 dias. Seus algozes tentaram vender a ideia de que ele se enforcara, mas logo se constatou que ele morrera em decorrência de torturas a que fora submetido no mesmo dia em que se apresentara para prestar depoimento, a 25 de outubro de 1975.
Passados 43 anos, diferentemente do que ocorre no Chile, nenhum assassino de Vlado, nem das outras centenas de vítimas de crimes cometidos por militares durante a ditadura foi identificado ou punido aqui entre nós.
A Justiça acha mais importante ocupar-se com crimes do colarinho branco que estão sendo punidos com a dureza que deveria ser dispensada a ex-torturadores, enquanto estes continuam impunes.
Comandante do DOI-Codi, o coronel Brilhante Ustra, além de jamais ter sido punido em vida pelas torturas, pelas prisões, pelas mortes, foi elogiado, há dois anos, em pleno Congresso Nacional pelo hoje presidenciável Jair Bolsonaro e seu rosto estampa camisetas usadas por seus simpatizantes com o slogan "Ustra vive".
O Estádio Nacional do Chile hoje se chama Estádio Victor Jara.
Se Bolsonaro tiver êxito, poderemos ter no futuro um Estádio Brilhante Ustra.
https://www.brasil247.com/pt/blog/alex_solnik/360611/Chile-condena-torturadores;-no-Brasil-%E2%80%9CUstra-vive%E2%80%9D.htm

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