Com prisões, Moro prejudicou o combate à fome
Marcelo Auler (*)
Há exatos cinco anos, em 13 de agosto de 2013, o juiz Sérgio Fernando Moro, à frente da ainda 2ª Vara Federal de Curitiba – posteriormente redesignada 13ª Vara – contrariando o posicionamento do Ministério Público Federal (MPF), concordou com o pedido da Polícia Federal e determinou a prisão preventiva de onze pessoas acusadas de fraudarem o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) com Doação, desenvolvido pela Companhia Nacional de Abastecimento – CONAB.
Sua decisão colaborou no desmonte de uma iniciativa bem sucedida de combate à fome, hoje defendida mundialmente pelo diretor-geral da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), José Graziano da Silva, como mostrou o Jornal do Brasil na edição de domingo (12/08) – Brasil precisa reativar políticas contra a miséria, defende José Graziano da Silva.
A partir dessa autorização, a Polícia Federal deflagrou a Operação Agro-Fantasma, em 24 de setembro do mesmo ano, e atingiu em cheio um programa do próprio governo federal. Uma ação que, como de hábito, contou com ampla divulgação pela imprensa. O alvo principal da investida foram associações e cooperativas de agricultores familiares do Paraná assim como servidores da CONAB. Em especial um gerente apontado como tendo ligações ao Partido dos Trabalhadores.
Embora tenha se oposto às prisões, o MPF apresentou oito denúncias envolvendo 45 pessoas. Em todas constava o gerente suspeito de ligações com o PT. Nestas ações, tentou criminalizar práticas do Programa, colocando-o sob suspeita generalizada. Decorridos cinco anos, os crimes apontados pela Polícia Federal e MPF – as denúncias relacionavam estelionato, associação criminosa, falsificação de documento público, falsidade ideológica, peculato e prevaricação – não se configuraram na visão da juíza Gabriela Hardt, substituta na Vara Federal. Ela assumiu os casos quando Moro mergulhou exclusivamente na Operação Lava Jato. Ou seja, onze inocentes ficaram presos indevidamente. Um deles 60 dias. O gerente da CONAB sofreu uma operação enquanto preso, e nem assim ganhou liberdade. A absolvição dos réus só foi noticiada em jornais ligados aos movimentos sociais.
Prejuízo no combate à fome – Além dos prejuízos nas vidas pessoais dos envolvidos, os efeitos da Operação Agro-Fantasma foram nefastos para a agricultura familiar e o próprio programa de combate à fome. É certo que o declínio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) com Doação também decorreu da falta de maior interesse pelos governos seguintes. Reduziram as verbas destinadas ao mesmo.
Em 2012, o programa em terras paranaenses atingiu o pico ao distribuir 16,2 toneladas de alimentos, apenas naquele estado. Resultado do trabalho de 8.215 famílias de pequenos agricultores. Com isso, beneficiou 1.208 entidades entre escolas municipais, asilos, associações de caridade. Mas àquela altura o programa já estava sob a mira da Polícia Federal de Guarapuava (município a 260 quilômetros de Curitiba), um dos polos paranaenses do agronegócio. Após a operação policial em 2013, o declínio foi vertiginoso, como mostra o quadro abaixo com dados fornecidos oficialmente pela CONAB.
FAO defende o programa derrubado no PR – Para atingir as 16,2 mil toneladas em 2012, o Ministério do Desenvolvimento Econômico e Social, via CONAB, aplicou, na agricultura familiar R$ 31.338.905,67. No total de alimentos fornecidos estão os mais diversos produtos: de hortaliças a leguminosas, passando por frutas leites e seus derivados e até mesmo carnes. Sem distingui-los, portanto, em um cálculo grotesco, a partir do valor investido e da quantidade de produtos entregues se chega a um preço médio do quilo de R$ 1,93. Em outro cálculo conclui-se que cada um dos 8.215 agricultores envolvidos nesta produção de 2012 faturou, no ano, R$ 3.814,84.
Um exemplo claro do estrago feito pela ação policial está na Associação dos Grupos de Agricultura Ecológica São Francisco de Assis (Associação Assis). Criada em 2002 por 22 famílias, ela se espalhava por cinco municípios: Irati, Teixeira Soares, Rebouças, Inácio Martins e Fernandes Pinheiro. Dez anos depois, em 2012, contava com 120 famílias associadas que entregaram cerca de 120 toneladas de alimentos. Após a prisão de três de seus líderes, em 2013 – os ex-presidentes Roberto Carlos dos Santos, Gelson Luiz de Paula, e o então presidente Nelson José Macarroni – e mesmo com eles inocentados, a entidade se esvaziou. Das 120 famílias associadas restam apenas cinco, como explica no vídeo abaixo Gelson, hoje com 46 anos:
Fundadores da Associação Assis, assim como Gelson, Roberto Carlos dos Santos, 49 anos, e sua esposa, Terezinha de Lima dos Santos, 52 anos, são exemplos claros dos prejuízos individuais que da Operação Agro-Fantasma. Ele e Gelson ficaram 48 dias presos na custódia da Polícia Federal, em Curitiba. Macarroni permaneceu 60 dias, em Guarapuava. Conviveram com todos os tipos de criminosos. Ainda demoraram três anos – participando de incontáveis audiências em fóruns distintos – para verem a Justiça reconhecer suas inocências, o que ocorreu em dezembro de 2016. Até hoje não conseguiram recuperar o trabalho na agricultura-familiar-ecológica. Roberto Carlos hoje se sustenta com o serviço em uma floricultura da cidade. Gelson sairá candidato a deputado federal pelo PT do Paraná pensando apenas em ter espaço para denunciar a injustiça que sofreu.
Na avaliação do advogado Claudismar Zupiroli, de Brasília, defensor de dois dos diretores da CONAB denunciados, mas não processados, o PAA era “o programa mais revolucionário, por pegar o mais marginalizado dos agricultores para beneficiar o cidadão mais marginalizado na cidade, os atendidos por creches, escolas públicas, asilos. Eram valores pequenos que para os agricultores era muita coisa, dado o nível de pobreza deles. Pegava a faixa mais pobre mesmo”.
Sai o tabaco, entram alimentos – O sucesso do programa pode ser constatado no fato de José Graziano da Silva, diretor-geral da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), sem saber do que se passou no Paraná, em entrevista a Lenise Figueiredo, do Jornal do Brasil, –Brasil precisa reativar políticas contra a miséria -, publicada domingo (12/08), defendê-lo como uma das soluções para se combater a fome no mundo.
Mais ainda. Na visão dos professores Anne Geraldi Pimentel, Juliana de Oliveira Sales, Katya Regina Isaguirre Torres e Carlos Frederico Marés de Souza Filho exposta no artigo A repressão político-judicial do Estado: a violência legítima da operação agro-fantasma e suas consequências para os agricultores campesinos da Região Sudeste do Paraná, na revista Emancipação, em 2017, o PAA teve um papel importante não apenas na questão da distribuição de renda. No trabalho, eles afirmam:
“A importância do PAA no município de Irati e região não se deveu somente à geração de renda, que possibilitou às famílias o sustento com o trabalho no campo, mas também porque tirou várias famílias do cultivo do fumo, com a conversão para cultura agrícola de forma agroecológica. Isto porque, o programa previa um preço diferenciado para os produtos produzidos agroecológicos e orgânicos, desde que houvesse a certificação. E na fala dos dois agricultores é perceptível que isso foi um marco na história de suas vidas, e percebem como um ganho, uma melhoria.”
Alimentos orgânicos doados – Roberto Carlos corrobora este entendimento: “Quando trabalhávamos na cultura do tabaco não tínhamos tempo para produzir outros alimentos como legumes, hortaliças, tubérculos”, lembra. Após despertarem para a agroecologia em 2000, criaram a Associação Assis em 2002. Inicialmente eram 22 famílias. A cada ano um novo grupo, que variava entre 10, 15, 20 famílias, aderia à produção de orgânicos. Em 2010, os 90 membros da Associação relacionaram 87 espécies de alimentos que colhiam.
O crescimento na produção levou a associação, que surgiu voltada apenas à subsistência das famílias, iniciar um processo de doação do que não consumiam para entidades assistenciais. Beneficiaram a Pastoral do Menor, asilos, hospitais filantrópicos, etc..
“Doávamos para não jogar fora sabendo que era um alimento saudável, de boa qualidade e que existia gente precisando comer. Então fizemos doações a várias instituições”, explica Roberto Carlos. Com o tempo despertaram para a possibilidade de comercializarem o que não consumiam.
Em 2005 se associaram ao Programa de Aquisição de Alimentos. Ele era mais usado pelas grandes cooperativas que vendiam ao governo safras de milho, soja e equivalentes. A legislação previa o atendimento da agricultura familiar, mas era incipiente. Foi a brecha por onde a Associação Assis entrou. No primeiro convênio o valor que a CONAB lhe repassou foi de R$ 20 mil. Atendeu 25 famílias, menos de R$ 1 mil por família naquele ano.
Em poucos anos, como mostra o quadro acima, a produção multiplicou-se em toda a região. Na Associação Assis o crescimento foi em progressão geométrica: em 2006 o valor pulou para R$ 40 mil. Em 2012, com 120 famílias associadas, produziram as 120 toneladas/ano, ou 10 toneladas/mês. Foi quando cada família recebeu algo em torno de R$ 3 mil/anuais. O que correspondeu a um investimento da CONAB de R$ 270 mil ao ano, apenas com a Associação Assis.
Mas surgiu a Operação Agro-Fantasma e o trabalho foi por terra abaixo.
PF buscou iate no meio do mato
A suspeita de fraudes e desvios no programa era algo aparentemente surreal. O PAA limitava a compra de produtos a R$ 4.500,00 por produtor a cada ano. Em situações excepcionais o repasse atingia R$ 8 mil anuais por agricultor. No pico da produção da Associação Assis, cada família recebeu no máximo R$ 3 mil por ano. Ou seja, o valor básico pago ao agricultor anualmente era menor do que os R$ 4,7 mil, a título de auxílio moradia pagos, ainda hoje, a juízes como o próprio Moro. Mensalmente.
Essas suspeitas surgiram nas investigações que a Polícia Federal de Guarapuava iniciou, em 2011, nos municípios de de Honório Serpa e Foz do Jordão. Partiram de delações de servidores da CONAB e até de pequenos produtores. Mas o juízo federal daquela cidade declinou da competência para o juiz Moro em Curitiba. Alegou que a maior parte dos “crimes” fora cometida na capital, junto à CONAB. Os agricultores souberam da investigação superficilamente. Chegaram a conversar com os responsáveis pelo programa na CONAB, mas foram tranquilizados porque tudo corria dentro dos padrões exigidos.
Não foi esse o entendimento do juiz Moro. Ao atender aos pedidos de prisão preventiva, encampou a tese exposta pela Polícia Federal. Por ela, “os valores liberados pelo CONAB para aquisição dos produtos rurais no âmbito do programa seriam repassados a associações e cooperativas rurais. Os responsáveis nas associações e cooperativas desviariam os recursos, forjando a aquisição dos produtos e a entrega destes às entidades destinatárias. Seriam fraudados documentos atinentes ao programa, especialmente as notas fiscais de venda de produtos rurais, emitidas pelos produtores rurais, e os termos de recebimento e aceitabilidade dos produtos rurais pelas entidades beneficiadas”.
Moro estava convicto dos crimes – Há, no entanto, uma suspeita de conotação política, como lembrou Gelson. O sucesso do programa, como se afirmou acima, retirou os agricultores da produção de fumo, bem como de produtos que utilizavam sementes geneticamente modificadas, como milho e soja. Afetou, portanto, o agronegócio. Sem falar que havia a desconfiança com relação ao PT, tanto que houve a perseguição ao gerente com ligações ao partido. O curioso eram os baixos valores distribuídos e que nem todos os coordenadores do projeto recebiam, como explica Gelson no vídeo:
A convicção que Moro demonstrou em seus despacho antes mesmo de todo o contraditório do processo, foi no sentido de que os crimes cometidos estavam não só desviando recursos públicos, mas prejudicando agricultores e parcela da população carente que recebia os alimentos. Isto fica claro nas afirmações que fez ao conceder as prisões preventivas:
“287. Os crimes prejudicam, além dos cofres públicos, os pequenos produtores rurais e as entidades beneficentes que poderiam ter acesso ao programa e à integralidade dos recursos por ele disponibilizado não fosse o comprometimento dos recursos com fraudes. Roubados, portanto, não só os cofres públicos, mas os grupos vulneráveis que se veêm privado de recursos pelos desvios fraudulentos.288. Há provas, portanto, de prática reiterada e habitual de crimes contra a Administração Pública em período considerável de tempo, de 2009 ao presente”.
Ao justificar as prisões, que não tiveram o apoio do Ministério Público Federal, Moro deixou claro já não pairar dúvidas sobre as ações criminosas:
“293. O respeito ao Estado de Direito demanda medida severa, mas necessária, para coibir novas infrações penais por parte dos investigados, por ser constatada a habitualidade criminosa e reiteração delitiva, com base em juízo fundado nas circunstâncias concretas dos crimes que constituem objeto deste processo“.
Toda essa convicção respaldou-se nos relatórios da Polícia Federal que não tratou de ouvir os suspeitos. No caso de Irati, por exemplo, nem os dois presidentes anteriores da Associação Assis – Roberto Carlos e Gelson Luiz -, tampouco o presidente à época, Macarroni, foram procurados antes de serem levados presos. Os dois primeiros penaram por 48 dias atrás das grades. Macarroni ficou 68.
Surpreendente também foi o fato de Moro utilizar um texto padronizado nos mandados de busca. Não teve a preocupação de tratar de forma específica os alvos da operação. Lidou com o caso como trata os chamados crimes de colarinho branco.
Quando os agentes da PF foram ao Recanto Nascer do Sol, sítio de três hectares, no Arroio Grande, área rural de Irati, seu dono foi surpreendido.
Roberto Carlos dos Santos, então com 44 anos, agricultor desde os 7 anos, jamais fora chamado a se explicar. Da noite para o dia, soube que era tido como “chefe de quadrilha”. Antes de ser levado preso, os policiais questionaram – e procuraram na propriedade – sobre uma embarcação. Um iate, nas palavras do agricultor. Seguiam a ordem de Moro que recomendava recolherem:
“(…) documentos relativos à evolução patrimonial dos investigados, incluindo investimentos financeiros, matrículas de imóveis, documentos de propriedade de veículos, de embarcações ou de outros bens de elevado valor econômico (…)”.
Enfim, uma realidade diversa daqueles alvos, pessoas simples, nascidos e criados na “roça”. Filho de agricultor, Roberto Carlos só aos 30 anos saiu de Irati para conhecer Curitiba, que fica a duas horas de ônibus. O litoral descobriu aos 40 anos, ao visitar Guaratuba (a 300 quilômetros), em um intercâmbio da Associação Assis para os associados conhecerem experiências de agroecologia. Quatro anos após pisar na praia pela primeira vez, deparou-se com policiais buscando um iate no seu sítio. Ainda hoje, ao relembrar aqueles momentos, não consegue esconder a emoção:
O que pareceu mais duro para eles é que não acreditavam na inocência que eles alegavam. Eram suspeitos. Passaram a ser tratados como “chefe de organização criminosa”. A estadia na carceragem da Polícia Federal foi considerada “terrível”. Pior porque imaginavam que iriam ser soltos logo, por se saberem inocentes. Mas assistiam todos os pedidos de liberdade serem negados, como descreveu Gelson:
Houve ainda prejuízos familiares, como recorda o próprio Gelson. “Minha filha que estava fazendo faculdade na época em que fui preso, abandonou o curso. Não teve condição de continuar. Minha avó, que estava bem, sofreu muito com a minha prisão. Ela sempre perguntava por mim. Queria saber quando eu ia sair. Durante o período em que passei preso, ficou doente e faleceu 15 dias antes de sermos libertados”.
Mesmo depois que foram libertados, demoraram a ser inocentados. A decisão saiu apenas em dezembro de 2016. Ainda assim, na região, são vistos com desconfiança e a Associação Assis sofreu um tremendo esvaziamento.
Crimes que Moro enxergou e não existiram
A suspeita maior que levou Polícia Federal, o juiz e o Ministério Público Federal investirem contra associações estava na burocracia das notas de entrega de produtos e nos registros de recebimento dos mesmos. Tanto que, ao analisar os processos em que Moro enxergou crimes, a juíza Gabriela Hardt identificou sim falhas administrativas e burocráticas.
As notas deveriam ser feitas individualmente pelo responsável de cada produção, constando os produtos entregues à instituição beneficiada. Uma nota para cada entrega. O que era um desafio burocrático aos agricultores. Mais complicado ainda já que o documento da CONAB permitia apenas quatro produtos em um único documento. E a diversidade, como já falamos, chegou a 90 produtos diferentes.
Na Associação Assis, a questão foi resolvida de forma coletiva, ainda que irregular. Em uma única nota, em nome de algum dos produtores, constava o total produzido por vários associados.
Ou seja, aparecia uma alta quantidade de um mesmo produto como se toda aquela quantidade viesse de um único agricultor e se destinasse a um mesmo estabelecimento. Na verdade, ele vinha de vários associados e era distribuído entre vários estabelecimentos, mas saí no nome de apenas um. Quando procurado, o estabelecimento dizia não ter recebido aquilo e, não raramente, até o associado admitia não ter produzido toda aquela quantidade, tampouco recebido o valor total que constava. Logo, desconfiaram de produtos não entregues e valores recebidos e desviados. O que realmente faltou à Polícia e ao próprio Moro foi ouvirem antes as explicações daqueles que foram presos sem chances de se explicar.
Ao dar chance ao contraditório – como manda a regra do Estado Democrático de Direito e do devido Processo Legal – a juíza Gabriela Hardt conseguiu entender que tudo não passou de falhas administrativas, ainda que graves.
Até as vacas não encontradas pelas fiscalizações e que Moro destacou no seu despacho, acabaram sendo explicadas. Pertenciam ao coletivo em um assentamento do MST, que estava ameaçado de ser despejado. Por isso, o rebanho vivia escondido e era facilmente remanejado para não correr o risco de ser apreendido quando de um possível despejo. No depoimento de Eliane de Souza, uma das assentadas no Acampamento Milton Santos, ela explicou: “Então lá tem a sede do assentamento e o pasto fica em volta, então se você chegar na sede, você não consegue visualizar o gado, você tem que entrar no pasto para ver”.
Outra questão discutida era a substituição de produtos. Ocorria por conta de intempéries. Em uma região onde são comuns as geadas, não raro uma hortaliça prometida meses antes não vingava por conta do tempo. No lugar dela, porém, eram entregues outras, no mesmo valor acertado, sem qualquer prejuízo, como esclarece Gelson no vídeo abaixo.
Em consequência da falta de uma melhor apuração dos fatos, onze prisões foram efetuadas injustamente. Uma das vítimas, inclusive, com problemas de saúde, teve que ser operada e nem assim conseguiu manter a liberdade conquistada no TRF-4, liminarmente. A oitava turma mandou que voltasse a ser preso.
Cinco anos após Moro autorizar as prisões dos agricultores sem que eles jamais fossem chamados a se explicar, as oito Ações Penais abertas com as denúncias do MPF não resultaram em nenhuma condenação. Na visão do Judiciário, não houve crime. Apenas questões burocráticas; “desvios administrativos”. Isso ficou claro no despacho da juíza Gabriela, em alguns dos processos a que foi possível acesso pois, de forma estranha, a maior parte destas ações continua em segredo de justiça como determinou Moro, no início da operação. Em uma delas, porém, ao explicar a absolvição, ela registrou:
“Diante do impasse narrado, o Ministério Público Federal não conseguiu se desincumbir do ônus de provar as acusações. O que assoma dos autos ao final da instrução processual é que o controle da execução do programa foi alarmantemente falho e relapso. A existência de irregularidades é patente. A denúncia, todavia, vai além, afirmando que essas irregularidades foram cometidas para encobrir desvio de recursos públicos, e esse desvio é que não foi comprovado: sem provas de desvio de valores ou obtenção de vantagem indevida, não resta configurado peculato ou estelionato; e ausente provas de dolo específico e interesse pessoal, não se pode falar em prevaricação”.
Na verdade, em alguns processos, como o da Associação Assis, em Irati, o próprio Ministério Público Federal acabou pedindo a absolvição dos réus. Poderia ter evitado todo o processo se cobrasse, no início do caso, uma melhor e mais detalhada investigação. Mas, à revelia do MPF, a Polícia Federal e o juiz Moro preferiram primeira prender, para depois buscar os esclarecimentos. Com isso, todo um trabalho da agricultura familiar acabou se perdendo, prejudicando justamente os “os pequenos produtores rurais e as entidades beneficentes”, que Moro, no Mandado de Prisão Preventiva disse defender. Não foi o que aconteceu.
(*) Esta matéria foi compartilhada com o Jornal do Brasil que na edição desta segunda-feira (13/08) publicou: Moro desmontou agricultura familiar.
https://marceloauler.com.br/com-prisoes-moro-prejudicou-o-combate-a-fome/
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