A juventude grita “não!”: A greve mundial dos adolescentes pelo clima
“Poucos adultos estão ouvindo” [6]. Essas são as palavras de Greta Thunberg, uma jovem sueca de 16 anos que foi indicada nesta quarta-feira ao Prêmio Nobel. Greta foi responsável por dar o pontapé inicial do que hoje tomou as ruas de diversos países pelo mundo inteiro. No princípio era a penas a adolescente sueca, solitária em frente ao parlamento sueco protestando contra o descaso das autoridades frente à destruição do planeta. Sexta após sexta Greta retornou, agrupando cada vez mais adolescentes que decidiram não aceitar a intoxicação do seu futuro.

O chamado “15M - a greve dos adolescentes pelo clima” aconteceu em 2.052 cidades de 123 países, onde estes jovens faltaram as suas aulas para protestar contra a destruição do nosso planeta, por não aceitarem que a ganância e a inércia dos “adultos” condene a vida do mundo inteiro. A greve chegou a ser de massas em alguns países, como na Itália que reuniu 1 milhão de pessoas distribuídas nas capitais em marcha.
Com palavras de ordem como “não existe planeta B” e “marche agora ou nade depois”, a juventude mostra que a apatia e o conformismo não são marcas da nossa geração, com muitos tentam apontar. Enquanto os “adultos” que Greta fala – políticos e empresários, multinacionais e Estados – caminham em direção à destruição das nossas possibilidades de existência, os jovens do mundo se recusam a aceitar calados o destino que lhes é dado.
A greve feita pelos adolescentes no dia de hoje levanta duas considerações importantes para compreendermos a atual situação que nos encontramos e como saímos desse cenário apocalíptico. Primeiramente, a denúncia contra a poluição, o desmatamento, a contaminação e o consumo desenfreado aponta uma ligação sistemática entre todas essas coisas. Se polui como se polui para que a produção – em fábricas, etc. - sempre constante de bens alimente o consumo estimulado entre todas as camadas possíveis da população. Consumo este que também gera taxas tremendas de poluição – seja pelo plástico que é produzido, pelos automóveis que poluem, entre outros. Todo esse ritmo frenético de produção e consumo é alimentado e nutrido por um sistema que implanta essas necessidades e demandas e depois age para supri-las. A denúncia dos jovens que saem em defesa da natureza e do clima também aponta - mesmo que nem sempre intencionalmente - que a única saída possível é por fora desse sistema. Se no capitalismo o que ordena e comanda nossas vidas são as classes dominantes, ou seja, sendo elas que ditam a produção, que comandam a nossa política e estabelecem nossa relação com a natureza, então é necessário romper com esse sistema e toda a lógica que o orienta.
A nossa sociedade tem a muito tempo sido orientada por uma ideologia desenvolvimentista que vê a natureza apenas como recurso, um objeto à disposição da humanidade para ser utilizada como bem quiser. Essa lógica extrativista e predatória, típica da sociedade capitalista, vende belos discursos de progresso e avanço, quando na verdade deixa um rastro de destruição e morte. O grito dos jovens que hoje marcham pelo nosso planeta denuncia essa lógica, rompe com o conformismo pessimista, assim como com os sonhos de progresso infinito do capitalismo, e aponta que há esperança para o futuro: Uma esperança na luta da nossa juventude que hoje defende o nosso amanhã.
Não existe um planeta B!
Certa vez, Frederic Jameson, um famoso crítico literário e teórico marxista, afirmou parecer ser mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo. Essa constatação aparentemente exagerada parece estar ganhando cada vez mais tons de realidade, principalmente ao observarmos o amplo movimento que nega o papel humano nas mudanças climáticas – em alguns casos nega até mesmo a existência de qualquer mudança climática.
Mais alarmante é o fato de termos em vários países – como no Brasil, em que Bolsonaro demonstra querer em algum momento sair do Acordo de Paris e já não mais sediará a COP25 – presidentes que são parte desse clã negacionista e obscurantista que dissemina informações mentirosas e distorcidas sobre a atual condição do nosso mundo, colaborando para a desinformação e, por consequência, continuidade da destruição do nosso planeta. Quando Trump, sem dúvidas o mais importante líder mundial, afirma desejar um aquecimento global para combater o “frio dos EUA” [1], ou até mesmo nega um relatório especializado produzido pela própria Casa Branca que evidencia a destruição da natureza pelas mãos do homem [2], percebemos que a constatação de Jameson não é tão exagerada assim.
Acontece que o lucro fala mais alto do que a preservação da Terra e a vida dos seus habitantes – humanos ou não. Segundo o relatório mais recente produzido pela IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), é urgente que limitemos o aumento médio de temperatura do planeta para 1,5ºC. Caso ultrapassemos essa barreira os resultados serão catastróficos, devastando ecossistemas e afetando diversas comunidades, pesando sempre para os países mais pobres, afetando o combate à pobreza e desigualdade [3].
Segundo o 6º Panorama Ambiental Global da ONU, o ritmo atual de degradação do planeta poderá trazer milhões de mortes até 2050 [4]. As causas dessas mortes são as mais variadas, como a infecção através de água poluída por bactérias – que poderá se tornar a segunda maior causa de morte até 2050 - e a poluição do ar. Trazendo para a realidade brasileira, o nosso país será um dos mais afetados por mortes em onda de calor [5], registrando um aumento de 25% de mortes em cenários com as ondas de calor em caso de baixa ocorrência e até 75% caso as ocorrências sejam altas. Segundo uma das meteorologistas responsáveis pelo estudo, tudo indica que a frequência e intensidade das ondas de calor no Brasil aumentarão.
O que tem sido feito para evitar esse cenário catastrófico? Muito pouco. O próprio relatório do IPCC foi desprezado pelos maiores líderes mundiais na COP24, sendo relegado ao papel de comentário e sugestão. O esforço necessário para reverter a situação atual exigiria dos países medidas drásticas que cortassem pela metade a produção de CO2, além de combater o desmatamento desenfreado de regiões como a Amazônia. Em suma, necessitaria um enfrentamento a políticas extrativistas e predatórias que devastam nossas florestas em benefício do agronegócio, além de exigir uma total transformação na nossa matriz energética, modificando completamente a organização industrial dos países do centro capitalista.
Se o objetivo fosse, de fato, salvar o planeta, seria imperativo intervir diretamente no lucro dos megaempresários e latifundiários que enriquecem com a destruição da natureza - seja destruindo nossas florestas para cultivo de soja e criação de gado, ou poluindo nossa atmosfera no atual funcionamento das fábricas e usinas, ou com a poluição dos nossos solos e águas contaminados de resíduos tóxicos e agrotóxicos, ou, ainda, com o incentivo ao consumo desenfreado. A luta ambiental do século XXI urge do anticapitalismo.
[1] https://www.gazetaonline.com.br/noticias/mundo/2017/12/trump-diz-que-gostaria-de--bom-e-velho-aquecimento-global--contra-frio-1014113015.html
[2] https://brasil.elpais.com/brasil/2018/11/27/internacional/1543283242_634443.html
[3] https://g1.globo.com/natureza/noticia/2018/10/07/novo-relatorio-climatico-do-ipcc-diz-que-mudancas-sem-precedentes-sao-necessarias-para-limitar-aquecimento-a-15oc.ghtml
[4] https://sustentabilidade.estadao.com.br/blogs/ambiente-se/planeta-em-degradacao-pode-trazer-milhoes-de-mortes-ate-2050-alerta-onu/
[5] https://jornal.usp.br/ciencias/ciencias-da-saude/brasil-vai-estar-entre-mais-afetados-por-mortes-em-ondas-de-calor/
[6] https://g1.globo.com/educacao/noticia/2019/03/15/poucos-adultos-estao-escutando-diz-adolescente-indicada-ao-nobel-que-criou-uma-greve-global-pelo-clima.ghtml
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