Esclarecimento sobre a manifestação do Secretário de Aquicultura e
Pesca acerca da Lista de Espécies de Peixes e Invertebrados Aquáticos
Ameaçados de Extinção
Foi publicado dia (10/05), na rede social do Sr. Secretário da Aquicultura e Pesca
do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - MAPA, Jorge Seif
Junior, vídeo que trata da Portaria MMA nº 445 de 2014, que estabeleceu a Lista
Oficial de Peixes e Invertebrados Aquáticos Ameaçados de Extinção no Brasil.
Sobre este importante instrumento de conservação da biodiversidade, Seif
Junior afirma [1]: "Eu tive acesso aos papeis da 445, que são fichas individuais,
as fichinhas são fichinhas assim, escrito o seguinte. Vamos dar um exemplo aqui
qualquer. Polyprion americanus, cherne-poveiro: não existem dados estatísticos
disponíveis para se tomar decisão. Embaixo: recomendação - proíbe. Ninguém
me falou, rapaz, ninguém me falou, não tô ouvindo, não é história da carochinha,
eu vi, eu vi a fichinha. Aí eu peguei uma, duas, três... De 10 fichas, duas tinham
estatística e oito não. E eles meteram nas nossas costas isso."
A fala do sr. Secretário não apenas demonstra desconhecimento sobre o
processo de avaliação do risco de extinção de espécies, mas também presta
desserviço à sociedade brasileira, uma vez que apresenta publicamente
informações que não possuem base técnica ou científica.
A Lista de espécies de Peixes e Invertebrados Aquáticos Ameaçadas de
Extinção foi produzida com base em amplo processo coordenado pelo Instituto
Chico Mendes - ICMBio, que contou com a participação de cerca de 300
especialistas do Brasil e do exterior, capacitados para a análise do estado atual
das populações existentes e das ameaças à sua conservação. Por meio da
aplicação de critérios claros e precisos, são fornecidos cenários concisos e
substanciados para que gestores e formuladores de políticas públicas possam
estabelecer medidas junto à sociedade voltadas para o uso sustentável do
patrimônio biológico. O conjunto de critérios utilizado foi desenvolvido ao longo
de décadas e atualmente diversos países utilizam essa metodologia para avaliar
o estado de conservação de peixes marinhos e continentais, incluindo recursos
pesqueiros, com participação de milhares de especialistas. Desde a publicação
da Portaria MMA nº 445 de 2014, não foram apresentados questionamentos
fundamentados em dados concretos que justificassem a sua revogação ou a
retirada de qualquer espécie.
As informações que embasaram a classificação de cada espécie como
ameaçada de extinção pode ser encontrada no Livro Vermelho da Fauna
Brasileira Ameaçada de Extinção, acessível no
site http://www.icmbio.gov.br/portal/component/content/article/10187.
Com relação ao exemplo citado pelo Secretário da Aquicultura e Pesca, o volume
VI do Livro Vermelho apresenta não apenas "uma fichinha" sobre a
espécie Polyprion americanus, mas seis páginas completas com informações
científicas sobre a distribuição geográfica, história natural, dinâmica
populacional e principais ameaças sobre a espécie. Uma simples leitura nesse
documento permite entender que "a espécie é extremamente vulnerável a pesca
por ter vida longa, em torno de 80 anos; tempo geracional estimado em 40 anos;
crescimento lento; maturação sexual tardia, de 11 a 15 anos e, especialmente,
por formar agregações reprodutivas em épocas e locais determinados,
conhecidos dos pescadores". O livro informa ainda que a espécie teve redução
populacional de 97%, justificando sua classificação como Criticamente Em
Perigo.
Não apenas o cherne-poveiro foi avaliado como ameaçado de extinção, mas
também foi objeto de moratória de pesca assinada em conjunto pelo Ministério
da Pesca e Aquicultura e o Ministério do Meio Ambiente em 2015, o que
demonstra que a necessidade de restringir o uso da espécie foi corretamente
reconhecido até mesmo pelo órgão responsável pelo fomento da pesca.
Todas as outras espécies presentes no Livro Vermelho possuem informações
técnicas que demonstram a necessidade de priorização de ações de
conservação, para evitar que elas desapareçam para sempre do seu ambiente
natural.
As Listas de Espécies Ameaçadas são ferramentas fundamentais para a
proteção da biodiversidade brasileira e previstas em lei. Ataques infundados às
mesmas colocam em risco as ações de conservação e promoção do uso
sustentável em curso, além de desrespeitar o corpo técnico envolvido no
processo. Lembramos que, conforme divulgado pela mídia, o Ministério da
Agricultura já solicitou ao Ministro Salles a suspensão completa da Portaria 445,
alegando que a lista gerou "grande repercussão negativa no setor pesqueiro", e
que produziria prejuízos econômicos à indústria da pesca [2]. A família do próprio
Secretário de Pesca, Seif Junior possui empresa de pesca, que já foi alvo de
pelo menos dez multas ambientais, o que poderia configurar um potencial conflito
de interesse. Conforme informa a mídia, "a mais grave delas é pelo transporte
de mais de 12 mil kg de cherne-poveiro, espécie classificada como criticamente
em risco de extinção"[3].
Nesse sentido, as entidades representativas dos servidores se posicionam
contra a fala do Secretário e questionam quaisquer revisões desta ou de outras
normas similares que não estejam claramente fundamentadas em critérios
técnicos e científicos e no interesse público.
[1] https://www.instagram.com/p/BxSiu5zhLwW/
[2] https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2019/04/ministerio-da-agriculturapede-fim-da-lista-de-animais-aquaticos-ameacados.shtml
[3] https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2019/04/familia-de-secretario-dapesca-tem-multa-relacionada-a-peixe-em-risco-de-extincao.shtml
http://www.ascemanacional.org.br/esclarecimento-sobre-manifestacao-do-secretario-de-aquicultura-e-pesca-acerca-da-lista-de-especies-de-peixes-e-invertebrados-aquaticos-ameacados-de-extincao/
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