13 de jul. de 2019

ZUGGI ALMEIDA: “HISTÓRIAS NEGRAS DEVEM SER ESCRITAS COM TINTAS NEGRAS”

ZUGGI ALMEIDA: “HISTÓRIAS NEGRAS DEVEM SER ESCRITAS COM TINTAS NEGRAS”



ZUGGI ALMEIDA
Publicado em 13 de jul de 2019

Por Zuggi Almeida
A história vem ao longo do tempo sendo registrada sob o olhar do dominador. O processo de desagregação começa pela extinção ou restrição de uso da língua nativa e imposição, em seguida, dos hábitos e costumes do povo conquistador.
Justo na língua estão os elos da corrente da resistência cultural.
Em África, quando da chegada dos povos invasores já existia uma longa tradição do uso da escrita, como na região da Etiópia ou nos caractéres árabes e os hieróglifos egípcios.
No Brasil, os africanos escravizados foram caracterizados como povos ágrafos e impossibilitados de registrar a história e a cultura do seu continente .Os portugueses se encarregaram de escrever a história brasileira sob a ótica lusitana e moldar suas vitórias, seus ídolos e impor uma das piores formas de dominação: a religião do invasor.
Tomemos como referências , o célebre escrivão Pero Vaz de Caminha, a imagem do padre José de Anchieta escrevendo em latim o Poema à Virgem, na praia de Bertioga.
Anchieta, embora português, é considerado o primeiro poeta brasileiro (sic). A história brasileira foi por um bom tempo escrita pelos representantes da Igreja Católica. 
A sociedade escravagista da época era em sua maioria analfabeta em contraste aos povos muçulmanos escravizados que dominavam a escrita e os cálculos.
A preservação da história negra brasileira deu-se através da oralidade e o candomblé foi fundamental nesse processo. 
O imaginário do cotidiano dos negros no Brasil ficou eternizado através das obras de Jean Baptiste Debret e Nicholas Taunay.
Negros ou negras acorrentados, sendo açoitados em condições de submissão. Assim foram ( e continuam) sendo estampados nos livros de História do Brasil, nas escolas.
O sofrimento negro poetizado por Castro Alves e mais recente, o negro cachaceiro ou a preta fogosa da literatura jorge amadiana.
Um maiores artistas brasileiro, o negro mineiro Antônio Francisco Lisboa é conhecido nos compêndios históricos pela alcunha de Aleijadinho.
Para a história escrita pela ótica branca, negro não tem nome. Negro tem apelido. O conjunto de obras de Antônio Lisboa, em diversas cidades de Minas Gerais podem ser equiparadas a arte escultórica de Rodin.
A história negra brasileira sempre enfrentou o boicote das elites, mas, vem ao longo dos tempos se perpetuando por força do trabalho da pesquisa acadêmica desenvolvido por profissionais negros e negras, pela cultura popular e por uma literatura de cunho racial sinalizada por Lima Barreto e muito bem representada na contemporaneidade pela excelência da escrita de Dona Conceição Evaristo.
No caso da escrita, as autoras negras brasileiras tem se notabilizado por uma produção crescente e de muita qualidade e já alcança o mercado internacional.
Ainda precisamos evidenciar a importância da nossa história na realidade negra brasileira com relatos produzidos por mãos negras e registrados com a cor da tinta preta dos nossos sentimentos.
Por mais páginas negras, filmes negros, telas negras. Arte negra em gênero, número e grau.
O meu olhar negro sabe muito bem o que seu olhar negro tem pra falar.
http://midia4p.com/historias-negras-escritas-com-tintas-pretas/
Zuggi Almeida é baiano, roteirista e escritor

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