Fernanda Giannasi: Mineradora Sama e transportadoras insistem em afrontar o STF que baniu o amianto no Brasil
por Conceição Lemes
Desde novembro de 2017, o amianto está banido no Brasil.
Em decisão histórica, o Supremo Tribunal Federal (STF) proibiu em todo o território nacional a exploração, produção, comercialização, transporte do mineral cancerígeno e de produtos que o contenham.
Porém, desde sexta-feira (06/12), caminhões carregados com sacos da fibra cancerígena, assassina, estão saindo da Sama S/A, em Minaçu, Norte de Goiás, rumo ao porto de Belém (PA), para exportação.
Integrante do grupo Eternit, a Sama é a única empresa produtora do amianto no País.
Só nessa segunda-feira (09/12) foram oito caminhões da Rápido 900, cada um com cerca de 26 toneladas.
Todos estão sinalizados com as placas “2590” e “9” obrigatórias por norma da Organização das Nações Unidas (ONU) para transporte de cargas perigosas.
A meta da mineradora é desovar 4 mil toneladas de amianto já lavrado e estocado o mais rápido possível.
Por isso, está recorrendo a outros prestadores de serviço, como a RodoJúnior Transporte e Logística, e a caminhoneiros autônomos para fazer o carreto até o Pará.
De Minaçu, os caminhões estão seguindo por Uruaçu e Porangatu, também em Goiás, sentido Belém do Pará.
A distância entre Minaçu e Belém é de 1645 km; em linha reta, 1343 km.
“A Sama, a Rápido 900, a RodoJúnior e os caminhoneiros autônomos estão burlando a decisão do STF”, denuncia a engenheira Fernanda Giannasi, fundadora da Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea).
“A retomada do comércio do amianto é uma afronta à Corte Suprema do País e um escárnio com a saúde e vida da população brasileira”, acrescenta.
RÁPIDO 900, MULTADA EM R$ 1 MILHÃO POR DANOS MORAIS COLETIVOS
A Rápido 900 de Transportes Rodoviários Ltda. é a maior transportadora nacional do minério amianto.
“É uma empresa reincidente no descumprimento de normas técnicas, legais e decisões judiciais”, observa Giannasi.
Em junho de 2015, por decisão unânime, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) multou-a em R$ 1 milhão por danos morais coletivos e proibiu-a de transportar, no Estado de São Paulo, o amianto “in natura” ou produtos que o contenham, sob pena de multa de R$ 100 mil.
Foi uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Trabalho de São Paulo (MPT-SP), com base na lei estadual 12.684/2007, que proíbe o uso de qualquer produto fabricado com amianto em seu território.
Em junho de 2009, um caminhão da transportadora foi flagrado pela fiscalização do Ministério do Trabalho carregando 24 toneladas de amianto branco (crisotila) em embalagens rasgadas, com farpas de madeira atravessando os sacos.
Em setembro daquele ano, houve outra apreensão de uma carga de 26 toneladas.
E, em fevereiro de 2010, outro caminhão da empresa, também com 26 toneladas do produto, envolveu-se em acidente na Rodovia Anhanguera, sendo necessária a intervenção de outros trabalhadores para retirar o material perigoso da pista.
Porém, devido ao banimento do amianto no Brasil, a Sama está com restrições nas estradas e portos.
Essa decisão foi confirmada pelo STF, em agosto de 2019. Explico. Atendendo à recomendação do Ministério Público do Trabalho (MPT), a Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), proibiu a exportação do mineral para Ásia pelo porto marítimo de Santos (SP), o maior do País.
A Sama recorreu ao STF, alegando que tinha autorização do relator da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 234, ministro Marco Aurélio, para exportação por portos e aeroportos, transitando por quaisquer rodovias.
Acontece que a decisão do ministro Marco Aurélio é anterior à decisão do Supremo, em novembro de 2017. Portanto, perdeu a validade.
— Ah, mas em junho deste ano o governador Ronaldo Caiado, sancionou uma lei que autoriza a extração do amianto crisotila no Estado de Goiás, para fins de exportação — certamente algum leitor de Minaçu já rebateu a essa altura.
“A lei sancionada pelo governador de Goiás é inconstitucional e totalmente descabida”, afirma Eliezer João de Souza, presidente da Abrea.
Espera-se que a lei goiana seja revogada em breve, pois Caiado não tem poderes para contrariar decisão do Supremo; e, muito menos, de impingir uma lei de Goiás aos demais estados da Federação.
Se dentro de Goiás, os caminhões prestadores de serviços da Sama estão circulando livre e impunemente com amianto, o mesmo não se aplica aos demais estados.
“Para chegar a Belém, os caminhões terão de passar por estradas federais. Por isso, estamos alertando a Polícia Rodoviária Federal (PRF) e as autoridades portuárias do Norte do País”, atenta a engenheira Fernanda Giannasi, auditora fiscal do Trabalho aposentada e ex-gerente do programa estadual do amianto do extinto Ministério do Trabalho e Emprego.
“À PFR, estamos pedindo para reter a carga tóxica em suas barreiras, fazendo-a retornar à sua origem”, explica a engenheira.
“Às autoridades portuárias do Norte do País, advertindo sobre a ilicitude das tentativas da Sama e das transportadoras de burlarem a proibição do amianto no Brasil”, completa
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