Suspeição de Moro: STF está diante de decisão política ou jurídica?
Suspeição de Moro: STF está diante de decisão política ou jurídica?
POR LENIO STRECK, MARCO AURÉLIO DE CARVALHO AND FABIANO SILVA DOS SANTOS PUBLICADO EM 14/04/2021
Já de pronto, nossa resposta é óbvia e simples: uma Suprema Corte tem a função de preservar a Constituição e a democracia. Argumentos políticos e de conveniência devem ser deixados em segundo plano, devendo, como fazem todas as democracias contemporâneas, prestigiar o Império do Direito, para usar o título de um dos livros mais importantes produzidos no século XX, por Ronald Dworkin.
Mas se isso para a comunidade jurídica tem uma resposta evidente, parece não ser para setores do jornalismo e da grande mídia, que parecem insistir e apostar na tese de que, ao fim e ao cabo, o que vale é a política. Foi assim durante todos os três anos em que lutamos, junto à Suprema Corte, pela presunção da inocência. Tínhamos que enfrentar não apenas as teses jurídicas contrárias às nossas, mas fundamentalmente as narrativas falsas que eram vendidas à sociedade (por exemplo, que a decisão do STF soltaria mais de 160 mil bandidos, estupradores etc.).
A questão, portanto, é saber discernir: é verdadeiro ou não que o juiz Moro atuou em foro que não era seu, resultando daí as condenações do ex-Presidente Lula? Se sim, a decisão do Ministro Fachin está correta.
É verdadeiro ou não que o juiz Moro atuou de forma parcial, cometendo os atos que a segunda turma, por maioria, imputou-lhe? São questões empíricas, que nada tem a ver com o conteúdo dos diálogos haqueados. Moro mandou fazer a condução coercitiva? Moro fez vazar ilicitamente os diálogos entre Lula e Dilma? Moro mandou grampear os telefones dos advogados de Lula? Nem precisamos ir mais adiante. Esses dados são verdadeiros? Se sim, resta apenas discutir se eles constituem a parcialidade-suspeição do juiz Moro.
Bom a segunda turma, por maioria de votos, disse que esses atos praticados pelo juiz Moro constituem quebra da imparcialidade.
Resta saber se o plenário do STF pode funcionar como instância recursal da turma. Achamos que a resposta é negativa.
Assim, temos que, empiricamente, está claro que os fatos correram. Não parece haver desacordos com relação a isso.
E, em termos jus-teóricos, também parece que não há desacordos no sentido de que se está diante de clara incompetência e escancarada suspeição.
As consequências políticas? Não cabe ao Império do Direito discutir os invasores políticos e morais que pretendem fragilizar suas fronteiras. O Judiciário – no caso, o Supremo Tribunal Federal – tem o papel de conservar as muralhas do castelo que protege o Império do Direito.
O Direito é a forma pela qual o poder deve ser controlado. O Direito deve exigir pedágio dos argumentos políticos e morais e não o contrário. O Império do Direito não é mero instrumento da política.
Eis a encruzilhada em que estamos. Na suspeição de Moro, a disputa é jurídica e não política. O Direto deve vencer.
A história registrará a parte que cabe a cada um nesse butim jus político. Não há registro no mundo contemporâneo – nem no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos que cuida desses casos na Europa – da conjunção de duas nulidades insanáveis: a suspeição e a incompetência reunidas em um mesmo juiz.
O que é isto – o Direito? O que é isto – o processo? O que é isto – a Constituição? Eis as perguntas.
Por qual razão existiria algo que seja maior do que as garantias processuais-constitucionais de um acusado? Seja ele quem for.
Afinal, processo não tem capa. Não tem rosto!
https://www.prerro.com.br/suspeicao-de-moro-stf-esta-diante-de-decisao-politica-ou-juridica/
Artigo publicado originalmente no Consultor Jurídico.
Lenio Streck
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Lenio Streck é jurista, professor de Direito Constitucional e pós-doutor em Direito pela Universidade de Lisboa. Membro catedrático da Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst) e membro da comissão permanente de Direito Constitucional do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), é sócio do escritório Streck e Trindade Advogados Associados. Veja todos os posts de Lenio Streck.
Marco Aurélio de Carvalho
Marco Aurélio de Carvalho
Marco Aurélio de Carvalho é advogado e sócio-fundador do Celso Cordeiro & Marco Aurélio de Carvalho Advogados. Membro integrante do Grupo Prerrogativas e associado fundador da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), é especializado em Direito Público e bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). É coordenador geral do Grupo Prerrogativas. Veja todos os posts de Marco Aurélio de Carvalho.
Fabiano Silva dos Santos
Fabiano Silva dos Santos
Fabiano Silva dos Santos é graduado em Direito pelo PUC-SP com MBA Executivo em Gestão Estratégica de Empresas pela Facamp, é mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e doutorando em Direito pela PUC-SP. É professor universitário, coordenador de improbidade e previdência na Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB-SP, membro da Comissão de Previdência da OAB-SP e da Comissão de Previdência do Conselho Federal da OAB. Veja todos os posts de Fabiano Silva dos Santos.
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