31 de jan. de 2018

Ensino Superior: Banco Mundial e seus problemas com os dados. - Editor - BANCO MUNDIAL, FMI E CONGENERES, SÃO OS ESCRAVOCRATAS DOS SENHORES BANQUEIROS ;CAPITALISTAS VORAZES ,QUE ESCRAVIZAM BILHÕES DE PESSOAS MUNDO AFORA. ESSE CICLO PERNICIOSO TEM QUE SER QUEBRADO. O MUNDO É BEM MAIOR QUE MEIA DUZIA DE BANQUEIROS ULTRA GANANCIOSOS.. DEMOCRACIA ECONOMICA PLANETÁRIA.

Ensino Superior: Banco Mundial e seus problemas com os dados Carlos Frederico Rocha1 Este artigo se volta à análise da proposta do Banco Mundial para o ensino superior. Ao longo do texto, argumentaremos que o relatório parte de uma análise viciada, desatualizada e, algumas vezes, falsa dos dados sobre a educação superior pública brasileira, levando a um diagnóstico equivocado de proposição da cobrança de mensalidades que acabará por aumentar, em vez de reduzir, a desigualdade social. O diagnóstico para a análise do ensino superior está baseado nos seguintes argumentos: (i) o ensino superior público abriga apenas uma minoria de estudantes, vindo, em sua maioria, de escolas privadas; (ii) o custo unitário do estudante de uma universidade pública é, em média, três vezes o custo de um estudante do ensino superior privado; (iii) o desempenho do estudante de universidades públicas não é melhor do que aquele de universidades privadas, argumentando pela maior eficiência das universidades privadas; (iv) ao ser o aluno de universidade público mais rico do que o aluno do ensino básico e o gasto público por aluno no ensino superior maior do que no ensino básico, a universidade pública auxilia na regressividade do gasto em educação; (v) os retornos privados do ensino superior são altos, justificando sua cobrança. O Relatório propõe, então: (i) criar um teto de gasto por aluno nas universidades públicas baseado nas universidades de melhor desempenho; e (ii) criar um sistema de pagamento da universidade pública pelo aluno, acompanhado de um sistema de crédito semelhante ao Programa de Financiamento Estudantil (FIES), igualando as condições de financiamento das universidades públicas à universidade privada. É verdade que o ensino superior público abriga apenas um em cada cinco estudantes do ensino superior. Contudo, está longe de ser correto que afirmar que o estudante de ensino superior vem em proporções maiores do ensino básico privado. O gráfico 1 apresenta dados de Franco e Cunha (2017), baseado em pesquisa da ANDIFES sobre a origem dos estudantes de Universidades Federais Públicas (IFES), de acordo com o tipo de estabelecimento em que estudaram durante o ensino médio. Como pode ser visto, o quadro pintado pelo Banco Mundial está longe de ser verdadeiro. Na verdade, após o estabelecimento do sistema de cotas em 2013, uma pequena minoria dos alunos (menos de um terço) vem do ensino privado. 1 Professor do Instituto de Economia da UFRJ. Gráfico 1 – Distribuição dos graduandos, segundo o tipo de escola que cursaram o ensino médio, por faixa de ano de ingresso (matrículas) nas IFES Fonte: Extraído de Franco e Cunha (2017). A segunda constatação do relatório do BM apresenta, talvez, o maior erro entre todas as medidas realizadas. Ao comparar o custo do sistema privado com o sistema público, o relatório revela desconhecimento sobre o sistema de ensino superior público no Brasil. 2 O cálculo do BM utiliza no numerador o gasto total das universidades e, no denominador, o número de estudantes de graduação na forma presencial. No entanto, ao contrário da maior parte do ensino privado, as universidades públicas não têm como única atividade a realização do ensino de graduação. No que se refere ao denominador, ignora o ensino de pós-graduação. Por exemplo, em 2014, a UFRJ mantinha 43 mil estudantes no nível de graduação. No entanto, havia ainda 12 mil estudantes de pós-graduação (entre mestrado e doutorado) que não foram contabilizados pelo relatório como fazendo parte do produto da universidade.3 A universidade pública realiza ainda pesquisa e extensão. Amaral (2017) estima o custo por aluno nas universidades públicas, excluindo-se os recursos destinados a pesquisa e extensão, chegando a um valor médio de pouco menos de R$ 14 mil, muito próximo àquele obtido pelo BM para as universidades privadas. Ao analisar o desempenho dos estudantes de universidades públicas e privadas, o BM comete mais um erro. É inegável o melhor desempenho das universidades públicas no ENADE. O relatório alega, então, haver viés de seleção nesse resultado. A universidade pública atrairia os melhores alunos e, portanto, o melhor rendimento no ENADE seria resultado de ter alunos melhores e não necessariamente de ter um ensino melhor. Assim, o relatório procura medir o valor adicionado ao aluno, comparando o seu desempenho com as notas do ENEM. O uso da medida é tentador, mas revela um outro viés. Ao realizar a prova do ENEM, os estudantes 2 Sob esse ponto de vista, conforme aponta Schultz (2017), o relatório não tem nem o cuidado de documentos predecessores do Banco Mundial de ressaltar que o diagnóstico e as prescrições se referem apenas ao ensino de graduação. 3 Deve-se chamar a atenção que o custo de um aluno de pós-graduação é maior do que o de um aluno de graduação. 50 58,2 61,8 64,5 60,2 5 5,3 3,9 4,7 3,8 4,4 3,4 4,1 3,9 4,5 39,7 33,3 30 28 31,5 0 10 20 30 40 50 60 70 2009 ou menos 2010-2011 2012-2013 2014-2015 Total Estudou apenas em escola pública Estudou parte em escola particular Estudou a maior parte em escola particular Estudou somente em escola particular estão competindo por uma vaga na universidade, seja ela pública ou privada. Ao fazer a prova do ENADE, nada está em disputa. Basta a assinatura para garantir o diploma. Logo, no primeiro caso, estamos diante de um processo de alta motivação, no segundo, de um processo de baixa motivação. A comparação dos dois está longe de adicionar alguma informação. Deve-se dizer, no entanto, em favor das IFES que a prova do ENADE envolve conhecimento específico, só adquirível na universidade. O BM alega ainda que o ensino superior público apresenta regressividade na distribuição dos recursos para a educação, ou seja, estaria destinando mais recursos para os mais ricos. De acordo com o relatório, os 40% de menor renda no país representariam 60% dos gastos do ensino fundamental público. Nos ensinos pré-escolar e médio públicos, de acesso ainda não universal, 50% dos gastos iriam para os 40% mais pobres. No ensino superior público, mais caro, apenas 15% dos gastos iriam para os 40% mais pobres e 65% iriam para os 40% mais ricos, de acordo com dados da PNAD. Na verdade, os dados da PNAD apresentam um quadro ligeiramente diferente (ver gráfico 2). Nele, percebemos que os 40% mais pobres representam 22% dos alunos e os 40% mais ricos representam 60%. O gráfico 2 apresenta também uma evolução bastante positiva da participação dos estratos mais pobres e mais ricos, no sentido de caminhar em direção à igualdade. Essa evolução é consequência de iniciativas importantes como o REUNI, a partir de 2007, e a criação do sistema de cotas, a partir de 2013. A total implantação da política de cotas só se finalizará em 2018 e, portanto, o perfil dos estudantes deve evoluir para uma ainda maior igualdade. A leitura de IBGE (2016) também mostra que os estudantes da universidade privada no Brasil são, em média, mais ricos do que os estudantes da rede pública. Gráfico 2 – Distribuição percentual de estudantes da rede pública no ensino superior, por quintos do rendimento mensal domiciliar per capita - Brasil - 2005/2015 Fonte: IBGE, PNAD, vários anos. Extraído de IBGE, Síntese de Indicadores Sociais, 2016. O gráfico 3 apresenta a renda domiciliar per capita média, por decil da distribuição de renda e a distribuição contribuição de cada decil para a desigualdade de renda. São nos dez por cento superiores e inferiores que estão os maiores diferenciais de renda. A explicação da concentração da renda no país está associada à elevada dispersão da renda dentro dos dez por cento superiores e os dez por cento inferiores. Assim, o terceiro e o quarto decis superiores estão distantes de representarem fatias ricas da população e têm muito menos a distingui-los de outros decis inferiores do que a população dentro dos dez por cento superior tem de diferença interna. Assim, a responsabilização individual pelo financiamento da universidade, como propõe o BM, retiraria, na verdade, a responsabilização social de financiamento pelos dez por cento mais ricos. Sob esse ponto, Castro e Tannuri-Pianto (2016) mostram que, com o perfil discente presente nas universidades federais, em 2012, o gasto nas IFES representava uma transferência de renda dos 20 por cento superiores para os demais estratos da renda. Logo, a individualização da cobrança tornaria a distribuição do gasto mais injusto, provavelmente dificultando o acesso de estratos inferiores de renda ao ensino superior.4 Existe, no entanto, a alternativa de cobrança apenas dos estudantes localizados nos 20 por cento superior. Nesse caso, não se perderia a transferência de renda para os estratos inferiores da distribuição e se reduziria a carga sobre toda a população. Além de ser apenas uma pequena parcela do total necessário, há um grave problema nessa proposta. A cobrança de mensalidade afastaria da universidade pública os estudantes de renda superior e os aproximaria de um sistema privado que criaria alternativas para absorvê-lo. Isso pode implicar a extensão da estratégia de segregação que foi seguida no ensino básico e que aprofunda as desigualdades hoje presentes na sociedade brasileira. Há, então, uma importante externalidade que a universidade pode nos prover: a integração social. A Universidade é, neste momento, o único momento na fortemente desigual sociedade brasileira em que o topo da pirâmide de renda convive com a base (ver Rocha 2017). Assim, ao contrário do preconizado pelo Banco Mundial, há mais do que simplesmente apropriação individual dos frutos do ensino superior. 4 A experiência internacional mostra que a cobrança de mensalidades ou anuidade reduz a matrícula da população no ensino superior. Neil (2009) mostra que, no Canadá, para cada C$ 1000, há uma redução de 2.5% a 5% da demanda. Dearden et al. (2011) encontram que um aumento de UK 1000 causa uma redução de 3.9% nas matrículas. Hubner (2012) para a Alemanha. Gráfico 3 – Níveis de renda domiciliar per capita, média por decil, Brasil, 2015., Fonte: IBGE, PNAD. Extraído de Oxfam – Brasil (2017). O BM estende, contudo, o argumento da desigualdade na comparação das populações que frequentam o ensino superior e o ensino básico públicos. Argumenta que o recurso aplicado no ensino superior seria regressivo quando comparado ao recurso aplicado no ensino básico. No entanto, o próprio relatório propõe a redução em 1 ponto percentual os recursos para o ensino básico.5 Portanto, os recursos que seriam retirados do ensino público não seriam destinados ao ensino básico, mas simplesmente seria cortado do orçamento. Assim, o que é, na verdade, preconizado pelo relatório é a redução da contribuição dos 10% mais ricos para o gasto em educação dos mais pobres. Ao contrário do que está afirmado no relatório do BM, não se trata de uma proposta de justiça, mas da redução da contribuição dos mais ricos para o bem-estar da sociedade brasileira. Amaral, N. C. (2017) Uma análise do documento “Um Ajuste Justo: análise da eficiência e equidade do gasto público no Brasil”. https://avaliacaoeducacional.files.wordpress.com/2017/11/analise-critica-bm-2017.pdf. Castro, C. R. e Tannuri-Pianto, M. E. (2016) Educação superior pública no Brasil: custos, benefícios e efeitos distributivos. https://www.anpec.org.br/encontro/2016/submissao/files_I/i5- facbff91b0ec967476764cecaf05c20b.pdf. Dearden, L.; Fitzsimons, E.; Wyness, G. (2009) The impact of tuition fees and support on university participation in the UK. https://www.econstor.eu/bitstream/10419/91545/1/665529252.pdf. 5 Mesmo não tendo universalizado o ensino infantil e o ensino médio, impressionando pela crueldade. Franco, A. M. e Cunha, S. (2017) Perfil socioeconômico dos graduandos das IFES. IPEA, Radar, 49, fev. Hubner, M. (2012) Do tuition fees affect enrollment behavior? Evidence from a ‘natural experiment’ in Germany. Economics of Education Review, Volume 31, Issue 6, 949-960. IBGE (2016), Síntese de Indicadores Sociais – Uma Análise das Condições de Vida da População Brasileira, 2016, https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv98965.pdf. Neil, C. (2009) Tuition fees and the demand for university places. Economics of Education Review, Volume 28, Issue 5, p. 561-570. Oxfam – Brasil (2017) A distância que nos une. https://www.oxfam.org.br/sites/default/files/arquivos/Relatorio_A_distancia_que_nos_une.p df. Rocha, C. F. O custo da integração. http://noblat.oglobo.globo.com/geral/noticia/2017/08/ocusto-da-integracao.html. Schultz, P. (2017) O Banco Mundial contra-ataca. http://www.unicamp.br/unicamp/ju/noticias/2017/11/27/o-banco-mundial-contra-ataca

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