6 de mar. de 2020

Desde seu primeiro mandato de deputado, Bolsonaro defende fechar Congresso

FASCISMO

Desde seu primeiro mandato de deputado, Bolsonaro defende fechar Congresso

Bolsonaro, franzino, apenas um verminho, em 1993.
No dia 22 de junho de 1993, a Câmara de Vereadores de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, aprovou por unanimidade uma moção de repúdio ao então deputado federal de primeiro mandato Jair Messias Bolsonaro, declarando-o mesmo persona non grata na cidade. O motivo foi que quatro dias antes, em 18 de junho, em uma visita do deputado a Santa Maria para participar de uma reunião organizada por um grupo de militares, Bolsonaro defendeu o fechamento do Congresso Nacional e a volta da Ditadura Militar no Brasil.
As declarações de Bolsonaro no Sul repercutiram muito mal no Congresso Nacional, e no dia 25 de junho de 1993, uma sexta-feira, Bolsonaro foi à tribuna da Câmara para tratar do assunto, mas não exatamente para esboçar um recuo:
Senhor presidente, nesta oportunidade, não quero justificar-me. Não me arrependo e não desminto nada do que está publicado na imprensa. Mas quero deixar minha posição nesta casa, porque algumas ilações começam a circular aqui dentro.
Notamos que, lamentavelmente, o Poder Legislativo está à beira da falência. Assim sendo, logicamente, a situação que reina no país pode ser modificada de uma hora para
outra. Diria mais: não existe golpe, fujimorização ou sequer regime de exceção sem a falência do Poder Legislativo. E estamos à beira da falência. Basta fazer uma pesquisa de
opinião para saber isso. E aos que estão radicalizando comigo vou até mais avante: sugiro que façamos um plebiscito para sabermos o que o povo, que é soberano, acha do atual papel do Congresso Nacional.
Senhor presidente, a atual Constituição garante a intervenção das Forças Armadas para a manutenção da lei e da ordem, conforme previsto no artigo 142. Mas essa desordem e descumprimento da lei só acontece, logicamente, após a falência do Poder Legislativo. O que tenho feito nas minhas reuniões é alertar para isso, exatamente. Sou a favor, sim, de uma Ditadura, de um regime de exceção, desde que este Congresso Nacional dê mais um passo rumo ao abismo, o que no meu entender está muito próximo.
Um levantamento feito por Come Ananás no Diário do Congresso Nacional daquele 25 de junho de 1993 mostra que, naquela data, pelo menos 15 deputados pediram a palavra no plenário da Câmara para manifestar repúdio às declarações de Jair Bolsonaro, após Bolsonaro reiterá-las na tribuna da casa.
A deputada Beth Azize (PDT-AM), por exemplo, pediu até que Bolsonaro fosse submetido a um exame de sanidade mental:
“Senhor presidente, entendo que, a partir das afirmações feitas neste plenário pelo deputado Jair Bolsonaro, cabe à Mesa instaurar imediatamente processo contra Sua Excelência e determinar que se proceda ao exame de sua sanidade mental. Senhor presidente, aqui já vi doido de todo jeito, mas nunca um com essas características. Tenho certeza absoluta também de que não estou falando sozinha, porque muitos colegas assistiram, estarrecidos, às afirmações de Sua Excelência. Entendo que daqui para frente a Mesa não tem mais o que esperar: esse parlamentar deve ser submetido a um processo nesta casa, estabelecido no próprio Código de Ética, principalmente porque Sua Excelência rasgou a Constituição neste plenário, não merecendo ser o porta-voz do povo brasileiro nem representante da sociedade na Câmara dos Deputados”.

‘O risco de promover o deputado Bolsonaro’

Já o deputado José Dirceu (PT-SP) classificou Bolsonaro como um provocador:
“Muitas vezes, parece-nos o mais acertado politicamente não aceitar provocações. Tenho certeza de que o deputado Jair Bolsonaro atua como provocador. Em nome de quem está atuando? Em nome próprio, porque em nome das Forças Armadas certamente não é. Os ministros militares e os altos comandos das Forças Armadas têm dado demonstrações de compromisso com a democracia”.
E completou, José Dirceu, sobre Bolsonaro:
“Se aceitarmos seu comportamento, amanhã não teremos autoridade política, muito menos perante a Nação, para defender a Democracia”.
O então presidente da Câmara dos Deputados, Inocêncio Oliveira, anunciou naquela sessão que estava determinando à Procuradoria Parlamentar e à Corregedoria-Geral da Câmara que, “interna e externamente”, encaminhassem representações contra Bolsonaro, tomando “todas as medidas cabíveis contra aquele deputado”.
“Certamente, quem exalta a Ditadura e prega o golpeamento das instituições democráticas não fala em nome das Forças Armadas brasileiras”, disse Inocêncio, e, sobre o que ele disse, este Come Ananás não fará qualquer trocadilho óbvio com a palavra “inocente”.
O chefe da Procuradoria-Geral da casa, Vital do Rêgo (PDT-PB), pediu a palavra para informar que ainda naquele dia apresentaria ao então procurador-geral da República, Aristides Junqueira, representação contra Bolsonaro por infração ao inciso XLIV do artigo 5º da Constituição Federal: “constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado democrático”.
Depois, o segundo secretário da mesa da Câmara, Cardoso Alves (Bloco-SP), que naquele momento ocupava a cadeira da presidência, deu o assunto Bolsonaro por encerrado naquela sessão: “sobre esse assunto, que ao meu ver já foi exauridamente debatido, corremos o risco de promover o deputado Jair Bolsonaro, se começarmos a falar demais sobre ele”.
Duas semanas depois, no dia 8 de julho de 1993, a Mesa Diretora da Câmara dos Deputados encaminhou à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da casa uma representação contra Bolsonaro por “ofensa ao decoro parlamentar”.

‘Estudioso da opinião pública’

O caso chegou ao New York Times. Um mês depois daquela sessão na Câmara, no dia 25 de julho de 1993, o jornal publicou uma reportagem intitulada “A Soldier Turned Politician Wants To Give Brazil Back to Army Rules”.
A reportagem do Times dizia assim:
Falando em seu escritório, um cubículo decorado com memorabilia militar e uma grande bandeira brasileira, o esguio congressista do Rio de Janeiro disse estar preparado para a reação que se seguiu: o maior jornal do Rio, O Globo, publicou cartuns na primeira página satirizando-o como um dinossauro de coturnos, e o presidente da Câmara dos Deputados, Inocêncio de Oliveira, exigiu que a Câmara cassasse seu mandato.
Mas duas semanas depois, algo ainda mais interessante aconteceu: em uma reviravolta, o presidente da Câmara fez se reconciliou publicamente com Bolsonaro. Estudioso da opinião pública, o líder do Congresso aparentemente leu as colunas de cartas dos jornais brasileiros.
“Em todo lugar que vou, as pessoas me abraçam e me tratam como um herói nacional”, afirmou Bolsonaro. “As pessoas nas ruas estão pedindo o retorno dos militares.
Exatamente um mês depois daquela reportagem, dois meses após aquela sessão na Câmara, no dia 25 de agosto de 1993, o deputado Mendes Ribeiro (PMDB-RS), relator da representação contra Bolsonaro na CCJ, apresentou voto pelo arquivamento do caso. No dia 27 de outubro, a CCJ aprovou o parecer do relator. Foram 28 votos a favor da improcedência e arquivamento da representação, três contra e uma abstenção.
A Procuradoria-Geral da República também deu parecer, ao STF, pelo arquivamento da representação contra o deputado Bolsonaro enviada pela Procuradoria Parlamentar. O argumento foi o da imunidade parlamentar e que Bolsonaro não havia cometido delito penal.
Foram estes, quando o verme era apenas um verminho, os primeiros de uma série infindável de arquivamentos no Congresso Nacional – e nas outras instituições deste país de estudiosos da opinião pública – de representações, denúncias e notícias-crime contra o “soldier turned politician”.
E aqui estamos nós.
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